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Reinaldo Azevedo

O único que está pensando em luta armada na eleição é Bolsonaro. Em entrevista, diz outra vez que só vai respeitar o resultado se vencer

Reinaldo Azevedo

29/09/2018 07h59

Bolsonaro empunhando um de seus argumentos prediletos: retórica, agora, é abertamente golpista

No começo, a coisa era discreta. Depois ficou desabrida.

Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, passou a falar uma linguagem abertamente golpista. E, agora, ameaça o processo democrático em si. Sem meios-tons. Na entrevista concedida a Datena, na Band, afirmou o seguinte:

"Não posso falar pelos comandantes [militares]. Pelo que vejo nas ruas, não aceito resultado diferente da minha eleição"

"Em 2015, eu aprovei o voto impresso, mas o Supremo derrubou. Não temos como auditar o resultado disso. A suspeição estará no ar. Se você ver (sic) como eu sou tratado na rua e como os outros são tratados, você não vai acreditar. A diferença é enorme".

"O que vejo nas instituições militares é que não tomariam iniciativa. Mas na primeira falta, poderia acontecer [uma reação] com o PT errando, sim. Nós, das Formas Armadas, somos avalistas da Constituição. Não existe democracia sem Forças Armadas".

Comento
Começo pelo fim. "Nós, das Forças Armadas" uma ova! Quem está disputando a eleição e um militar da reserva, não um representante das Forças Armadas. O eleitor não estará dizendo "sim" ou "não" ao Exército, que, felizmente, é muito diferente de Bolsonaro como instituição, ainda que ele possa ser o predileto da caserna. Predileto, mas nunca unânime. Conheço oficiais que não votariam nele nem sob ameaça de corte marcial.

Mais: as Forças Armadas são, sim, esteio da democracia. Mas, segundo a Constituição, só entram em ação a pedido de um dos Três Poderes da República. E o fazem para garantir a ordem e a independência dos ditos-cujos. Não para substituí-los. É um espanto que estejamos debatendo esse assunto nos 30 anos da Constituição.

As suspeitas que Bolsonaro lança contra a segurança das urnas e a lisura do processo não têm nenhum fundamento e são o que são: justificativa para eventual derrota e convite à arruaça caso isso ocorra.

E não é uma arruaça qualquer, não. Ele está, ainda que de modo oblíquo, convidando os militares a intervir caso ele seja derrotado. Vejam lá: "Não posso falar pelos comandantes…" Bem, acho que os comandantes podem falar por si mesmos se quiserem. Algum deles se atreve a dizer que, a depender do vencedor, a eleição não vale?

Bolsonaro não tem nem argumento técnico nem argumento político contra as urnas. Ademais, cabe a pergunta: se ele vencer, o sistema eletrônico de votação estará, então, validado? Aí cessam as suspeitas? É ridículo. Além de perigoso.

E notem o terceiro trecho que destaquei: segundo o pensador, na "primeira falta, poderia acontecer [a reação], com o PT errando".

Não dá!

O que seria a "primeira falta"? O país dispõe — ainda! — de instituições que podem coibir quem pretende golpeá-la. Quem está falando em não respeitar o resultado das urnas é Bolsonaro. E essa é uma falta grave.

O PT errou. Veio o impeachment. Dilma caiu. Os petistas não gostaram, protestaram, foram às ruas. Nada que tenha ido além do que permite a democracia. O partido está tentando voltar ao poder pelas urnas. O único que está pensando em luta armada é Bolsonaro.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.