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Reinaldo Azevedo

Você manda fazer faxina no seu escritório? Está querendo esconder o quê?

Reinaldo Azevedo

22/03/2019 08h18

Um dos trechos mais intrigantes do perspicaz despacho do juiz Marcelo Bretas está na página 41. Reproduzo abaixo:
"Um exemplo de como outras medidas podem ser ineficazes, no caso, é o resultado de diligências na sede da ARGEPLAN, determinadas pelo STF, no âmbito da Operação Patmos (maio/2017). Como assinalado no Relatório do IPL 4621, alguns escritórios da empresa passavam por limpeza diária, sendo os funcionários orientados a manter os ambientes vazios; além disso, o sistema de registro de imagens (CFTV) da empresa ARGEPLAN também não gravava a movimentação diária (ou eram apagadas). Este fato parece indicar que os investigados estão agindo para ocultar ou destruir provas de condutas ilícitas, o que reforça a contemporaneidade dos fatos, bem como a necessidade da medida mais gravosa."

Garanto que isso é inédito no mundo democrático.

Então vamos ver. Como as imagens não são gravadas, aí estaria um indício de destruição de provas. Como sabemos, a esmagadora maioria das empresas que têm sistema de monitoramento de imagens as apaga depois de algum tempo. E não para destruir provas, mas para liberar memória dos computadores. Ocorre que, com isso, as pessoas ficaram impedidas de gerar provas negativas — !!! — para o juiz Bretas. Como elas não tomaram esse cuidado em sua própria defesa, o juiz vê sinal de destruição de provas.

E, bem…, nunca antes na história do direito, um simples trabalho de faxina foi tomado como outra evidência de destruição de provas.

E notem que essas duas coisas — não arquivar as imagens e fazer a faxina — são, para Bretas, sinais da "contemporaneidade dos fatos".

Então, para o juiz, está satisfeito um requisito do Artigo 312 do Código de Processo Penal para garantir a medida cautelar.

O acusado está cometendo crimes no presente? Sim! Qual é a evidência? Ele não arquiva as imagens de câmeras internas e manda fazer faxina no escritório.

A esse ponto chegamos.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.