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Reinaldo Azevedo

GOVERNO E PROPAGANDA 2: Fim a teorias conspiratórias e sede de unanimidade

Reinaldo Azevedo

28/03/2019 21h51

O ódio como política de propaganda, que chegou à excelência também com o stalinismo, atingiu na Alemanha nazista o seu estado de arte — a arte da transformação do outro em coisa a ser eliminada. E, como acontece nesses casos, o mal se propaga como remissão dos oprimidos e como suposta resposta a uma agressão perpetrada pelas vítimas. Goebbels foi explícito naquele dia:
"Esta insolência judaica tem mais passado do que terá futuro. Em pouco tempo, ensinaremos os senhores da Karl Liebnecht Haus [sede do Partido Comunista] o que é a morte, como nunca aprenderam antes. Eu só queria acertar as contas com os [nossos] inimigos na imprensa e com os partidos inimigos e dizer-lhes pessoalmente o que quero dizer em todas as rádios alemãs para milhões de pessoas."

Governos não estão obrigados a gostar do que leem na imprensa. Ao reagir ou responder ao que lhes parece impróprio, podem fazê-lo apelando ao aprimoramento das instituições democráticas ou à sua degradação. Na verdade, não só o governo: a recomendação cabe a todos os entes do Estado que respondem pela institucionalidade, o que inclui os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público.

A primeira coisa a ser eliminada na comunicação de Bolsonaro com as várias vozes que compõem a República — e espero que Wajngarten, se confirmado no cargo, seja bem-sucedido em tal esforço, se é que considera isto um problema, claro! — é a suposição de que existe uma grande conspiração na imprensa contra o presidente da República. Bolsonaro não é Hitler, e nós não somos o "Berliner Tageblatt" ou o "Die Rote Fahne" desse Hitler que não há porque tais veículos, por seu turno, tinham aquelas intenções conspiratórias apenas nas cabeças interessadas em alimentar a paranoia militante que viria a dar sustentação ao horror. Em 1933, a Alemanha ainda era uma democracia. Já agonizante. Morreu. E sua morte matou milhões. E os assassinos falavam a linguagem dos oprimidos — o que também é frequente na história.

Outra tentação de que um governo deve se livrar é a de obter a unanimidade, buscando instrumentos para calar seus críticos, seja pela asfixia econômica, seja pela demonização — no tempo de Goebbels, pelas rádios; hoje em dia, pelas redes sociais. Pode parecer pura retórica, mas se saem bem nos regimes democráticos aqueles que aprendem com seus adversários, sem procurar nem calá-los nem cooptá-los. O PT, por exemplo, foi reprovado nessa lição. E contribuiu para criar o caldo de ressentimentos que se viu.

Como é mesmo? "Um bom governo sem propaganda dificilmente se sai melhor do que uma boa propaganda sem um bom governo. Um tem que complementar o outro." Eis uma verdade que foi pronunciada sobre o que viria a ser uma montanha de muitos milhões de cadáveres. Pergunta-se: e se puder ser aplicada em favor da vida, da tolerância, da democracia sem adjetivos, da eficácia das políticas públicas — que ou têm como objetivo melhorar a vida dos que mais sofrem ou, então, são apenas instrumentos a serviço do aprimoramento da desigualdade?

Aí passa a ser artigo de primeira necessidade de um regime democrático. Vamos ver o que será.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.