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Reinaldo Azevedo

Gênios! Bolsonaro e Weintraub criam a 1º base sólida de repulsa ao governo

Reinaldo Azevedo

11/05/2019 08h15

O governo Bolsonaro não é exatamente craque em fazer bons diagnósticos da realidade, não é mesmo? Não sei, não… As universidades federais, quando se analisa a trajetória orçamentária, já estavam operando no osso. Nos últimos anos, as dotações orçamentárias têm caído. E aí veio o anúncio do contingenciamento, feito da pior maneira pelo inacreditável Abraham Weintraub, ministro da Educação — aquele que gosta de fazer pantomima com bombons sob o pretexto de ser didático.

Os grupos mais radicalizados à esquerda sempre ficaram muito longe de conquistar a adesão da larga maioria dos estudantes. Uma coisa é tomar os aparelhos de representação, em eleições com baixo quórum; outra é ter o apoio efetivo dos alunos. No governo Bolsonaro, isso pode mudar. E essa reação, que parece estar em curso, nem tem a marca original de um óbice ideológico. De fato, o grande gênio que habita o Palácio do Planalto conseguiu tirar esse "viés" da repulsa a seu governo na área da educação — ao menos como marca principal.

Weintraub achou que era uma boa ideia deixar as universidades a pão e água e ainda tratar do assunto de uma maneira circense — de circo mambembe. Nota-se a formação do que pode ser um primeiro núcleo realmente organizado de reação ao governo. Um governo que caminha para ser impopular num país que cresce pouco, com um desemprego ainda cavalar. Sabemos como são essas coisas: sempre começam por algum lugar e… O governo Dilma começou a apodrecer quando o Movimento Passe Livre achou que era a hora de radicalizar à esquerda, com o seu "socialismo da catraca". Deu no que deu. As insatisfações difusas começaram a se juntar. Quando o MPL percebeu que as ruas haviam invertido o sinal ideológico do protesto, era tarde demais.

Não estou fazendo uma associação entre os dois momentos. Apenas chamo a atenção para o fato de que uma reação organizada que parece ser de nicho pode ser apenas um primeiro passo. E, como se nota, Bolsonaro está esticando excessivamente a corda, dados o seu reacionarismo delirante e as múltiplas incompetências do seu governo. Desde a primeira hora de governo, o ensino como um todo e as universidades federais em particular são tratados como um lixo do qual o governo precisasse se livrar.

Nada a estranhar, não é mesmo? Bolsonaro nomeou um ministro do Meio Ambiente que odeia o meio ambiente e considera inimigo o corpo de servidores da área. E pôs na Educação um ministro que odeia a… educação — em especial o ensino universitário, do qual ele foi servidor medíocre e ressentido. E os frutos bichados serão colhidos…

PESQUISA
As nuvens vão se adensando. Informa a Folha:
O cenário criado pelo contingenciamento de verbas nas universidades brasileiras só se compara ao que havia nos tempos de hiperinflação dos anos 1980 e 1990, dizem cientistas ouvidos pela Folha. "São muitas histórias ruins. Voltaram problemas que só aconteciam na época da inflação, como cancelar projeto aprovado ou em andamento. No caso de um dos meus, deixaram de pagar um terço da verba vinda do CNPq", conta Fabrício Santos, um dos principais geneticistas do país e professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Projetos sobre o impacto dos desastres de Mariana e Brumadinho na fauna do rio Doce, por exemplo, foram paralisados na universidade. O CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, é uma das grandes fontes de financiamento federal à pesquisa no Brasil. A outra é a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), ligada ao Ministério da Educação
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PARALISIA
O risco de paralisia em vários campi é real. Leiam o que vai na Folha. Não se esqueçam: enquanto essa coisa rolava, o ministro da Educação brincava com bombons.
O corte de R$ 2 bilhões nas universidades federais promovido pela gestão do presidente Jair Bolsonaro (PSL) agravou a crise das instituições, que já enfrentam atraso de fornecedores, fim de atividades de extensão e redução de benefícios aos estudantes. A Folha ouviu reitores, professores e alunos de 14 das 68 unidades do país, que relatam impacto no cotidiano dos campi e dizem que, caso seja mantida, a medida pode colocar em xeque o funcionamento dessas instituições no segundo semestre. Os bloqueios atingiram até agora, em média, 30% das verbas discricionárias das federais —que incluem manutenção e investimentos, sem contar salários—, mas ainda podem ser maiores, já que na semana passada o governo definiu um novo bloqueio de R$ 1,6 bilhão cuja divisão por área ou órgão ainda está sendo analisada. Ao todo, as restrições no orçamento devem atingir cerca de 1,3 milhão de alunos do ensino superior.
Uma das primeiras afetadas pela medida do ministro da Educação, Abraham Weintraub, a Universidade Federal da Bahia terá R$ 43 milhões a menos para custear serviços como água, energia e segurança e já tem fornecedores com pagamentos em atraso. Na última quarta (8), os funcionários de uma das empresas que prestam serviço de vigilância dos campi paralisaram as atividades por não terem recebido os salários. "Há uma intranquilidade dos fornecedores, que sabem que estamos vivendo um momento de restrição. Começamos a ter dificuldades até mesmo nas nossas licitações", diz o reitor João Carlos Salles.
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PROTESTOS
Bem, o caminho óbvio são os protestos. Em vez de o governo buscar reunir a comunidade universitária para aos menos expor as dificuldades e pedir cooperação, assistimos à tática da porrada, da desqualificação, do achincalhe. Em outros tempos, poder-se-ia dizer: "Ah, nunca se sabe se haverá a real adesão de alunos e professores…" Claro! Nunca se sabe! Ocorre que, desta vez, o governo está fazendo a si mesmo o desfavor de juntar descontentes dos mais variados matizes. Afinal, apelando à ironia, até para que eventuais estudantes bolsonaristas possam se manifestar, é preciso haver uma universidade em funcionamento.  Leiam o que vai na Folha:
A UNE (União Nacional dos Estudantes) convocou estudantes de todo o país para uma mobilização nacional na próxima quarta-feira (15) contra os cortes de verba nas universidades federais anunciados pelo governo Jair Bolsonaro (PSL). Sindicatos ligados à educação já haviam anunciado paralisação e manifestações nessa data contra a reforma da Previdência. Com o bloqueio de verbas e a suspensão de bolsas de pesquisa, a UNE decidiu fazer uma nova convocação para os protestos e colocar a reversão dos cortes nas instituições como pauta prioritária.
A entidade descarta, no entanto, uma greve estudantil posteriormente. "A nossa convocação é universidade aberta funcionando a todo vapor, porque o sonho do Bolsonaro é que a universidade pare", diz a presidente da entidade, Marianna Dias. Apesar de afastar uma paralisação prolongada, ela afirma que os estudantes vão parar em dias pontuais, como na greve geral convocada para 14 de junho, e farão uma série de manifestações contra os cortes. "A mobilização vai ser todo dia, nas universidades e nas ruas, mas as paralisações vão ser pontuais." Desde o anúncio dos cortes, alunos e pesquisadores já vêm promovendo atos em algumas cidades do país. A ideia é que a quarta-feira seja um marco da nacionalização desse movimento. "O dia 15 vai ser um dia histórico, o início de uma movimentação massiva", afirma Marianna.

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ENCERRO
Weintraub está de parabéns! Conseguiu em um mês o que o movimento estudantil vem tentando há dois anos: mobilizar a galera. Um gênio à altura do governo Bolsonaro

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.