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Reinaldo Azevedo

A bazófia de Bolsonaro sobre Flávio. Ou: O tsunami virá, sim, presidente!

Reinaldo Azevedo

17/05/2019 08h23

O presidente Jair Bolsonaro saiu nesta quinta em defesa do senador Flávio de mesmo sobrenome, segundo aquela ótica e aquela ética do "sangue do meu sangue". Já estava, dado o parentesco, na zona de perigo. Afinal, sempre ficou claro que a família atuava como um clã. E tudo sugere que Flávio seja o intelectual das finanças — assim como cabe a Eduardo o terreno da teoria política e a Carlos o da prática. O modelo funciona que é uma beleza, não é mesmo?

Bolsonaro, aquele que tem Sérgio Moro como ministro da Justiça, saiu-se com uma conversa que misturou, a um só tempo, a bazófia do brigão e a covardia de quem teme o resultado da investigação. De toda sorte, desafiou a Justiça e o Ministério Público. Ao comentar o caso, afirmou:
"É uma jogadinha. Quebraram o sigilo bancário dele. Desde o ano passado. E, agora, para dar um verniz de legalidade, quebraram oficialmente o sigilo dele e de mais 93 pessoas [na verdade, a quebra atinge 89 pessoas e seis empresas]. Nossa Senhora, hein? Tem uma Lava Jato aí. Vai fundo. Vai fundo. Tá ok? O objetivo? Querem me atingir? Quebrou o sigilo desde o ano passado. Isso aí é ilegalidade. O que diz a jurisprudência, não sou advogado? Nulidade do processo. Fizeram aquilo pra quê? Façam justiça! Querem me atingir? Venham pra cima de mim! Podem vir pra cima de mim! Querem quebrar meu sigilo? Sei que tem que ter um fato. Mas eu abro meu sigilo. Não vão me pegar!"

Para quem gosta dos rigores da língua, a gente poderia dizer que um "não vão me pegar" é coisa distinta de "eu não fiz nada!" E acho que não preciso explicar a diferença. É pura conversa mole essa de Bolsonaro. Ele só poderia responder, por crime comum ou por crime de responsabilidade, por atos cometidos a partir de 1º de janeiro deste ano. O que quer que tenha feito antes do exercício do mandato só será alvo de processo e sanção penal depois que deixar a Presidência. Assim, esse "venha para cima de mim" é só uma besteira de quem decidiu, na verdade, cobrar a nulidade do processo. Os Bolsonaros acham que investigação é coisa para os outros. E não! Flavio não tinha tido o sigilo quebrado antes. Ademais, fosse isso verdade, não haveria motivos para ranger de dentes agora.

Bolsonaro está se metendo no olho do furacão. Informa a Folha:
"A quebra dos sigilos bancário e fiscal de 95 pessoas ou empresas (…) pode ter desdobramentos em outras apurações no entorno do atual senador (…) Os braços potenciais incluem as milícias, a condução do PSL no estado (sob comando de Flávio), a primeira-dama Michelle Bolsonaro e a ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro. (…) Queiroz indicou para o gabinete do então deputado estadual duas parentes de um ex-PM acusado de comandar uma das milícias mais violentas do Rio. Flávio, por sua vez, usou suas assessoras na Assembleia para tocar a própria campanha ao Senado e estruturar o PSL no estado. Ao mesmo tempo, o gabinete de Flávio abrigou parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda ex-mulher do presidente com quem ele teve um rompimento atribulado em 2008 —período que inclui a quebra dos sigilos. Outro ponto que pode ser aprofundado é o pagamento de R$ 24 mil feito por Queiroz à primeira-dama. (…) Queiroz já admitiu que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem o conhecimento do então deputado. Esse posicionamento serviu como uma das bases para os pedidos de quebra de sigilo de todos os ex-servidores do gabinete de Flávio. Isso inclui servidores que circularam também pelos gabinetes do próprio Jair Bolsonaro, quando exercia mandato na Câmara dos Deputados, como do vereador Carlos (PSC-RJ)."

Num segundo momento, advertido certamente para o tom desastrado e desastroso da entrevista, o presidente sugeriu que procurassem seu filho.

Bolsonaro está falando grosso para ver se intimida os órgãos de investigação. Parece se esquecer de que há um ex-presidente na cadeia, condenado sem provas por seu ministro da Justiça. Há dias, um outro teve o mesmo destino, de onde saiu com habeas corpus, num caso escancarado de abuso de poder de um juiz.

Há muito se cobra de Flávio e de Fabrício explicações que nunca vieram para um monte de jabutis em cima de árvores. A evolução do patrimônio do filho mais velho de Bolsonaro pode ser chamada de tudo, menos de ortodoxa. Por que lembro o caso de dois ex-presidentes que foram para a cadeia mesmo contra a ordem legal?

Porque a tal ordem legal não teria como conviver com os imóveis que Flávio têm e com as aplicações que ele não tem, ainda que não estivessem dadas as aberrações contra os antecessores de Bolsonaro. Com elas, senhor presidente, fique certo, está traçado um destino.

A bazófia é inútil.

O tsunami virá, como diria o filósofo das metáforas, Carlos Bolsonaro.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.