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Reinaldo Azevedo

De general a Banco Central, agora todo mundo cuida da articulação política!

Reinaldo Azevedo

20/06/2019 08h00

Luiz Eduardo Ramos, ainda general da ativa, agora em trajes civis, a fazer a coordenação política (Foto Antônio Cruz/Agência Brasil)

Oba! De general a Banco Central, agora todo mundo cuida da política. Querem ver que bacana?

O presidente Jair Bolsonaro tirou a tal articulação, agora para valer, das mãos de Onyx Lorenzoni e a passou para as do general — da ativa! — Luiz Eduardo Ramos, novo secretário de governo. Um general — da ativa! — fazendo política estará sempre fora do lugar numa democracia porque abre uma vereda entre a política e os quarteis. Não sou eu que quero assim, são os fatos, são as palavras.

A menos que haja em tal tipo de democracia alguma tentação latente que aponte para algum outro modelo de governo. E cumpre a quem zela pelo regime de liberdades públicas ser vigilante. E, claro!, sempre haverá aqueles que dirão: "Ora, o que é que tem? É o jeito brasileiro de fazer democracia". Errado! Temos o nosso jeito de fazer samba, porque é nosso; temos o nosso jeito de fazer bossa nova, porque é nossa; temos o nosso jeito de jogar capoeira; porque é nossa. O nosso jeito de fazer democracia pode perfeitamente bem ser apenas um modo de dar cor local ao autoritarismo.

Deixo claro que a articulação política nas mãos de qualquer outro que não Lorenzoni tende a ser mais funcional. Vamos convir: ele se mostrou um desastre continuado na área. A reforma da Previdência vai sair, vamos ver qual, por esforço de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara; de Rogério Marinho, secretário da Previdência, e de Samuel Moreira (PSDB-SP), relator da matéria na Câmara. Estivesse o assunto a cargo de Lorenzoni, Bolsonaro poderia pegar o chapéu e voltar para casa.

E uma nota sobre o general Ramos. Aqui e ali, lê-se que seria, sei lá como dizer nestes dias, um "progressista" talvez. É expansivo no trato pessoal, em contraste com os modos comedidos do general Santos Cruz. Teria ainda trânsito até com parlamentares de esquerda etc e tal. Bem, há nessas considerações um déficit de percepção da realidade.

Na chefia do Comando Militar do Sudeste, Ramos tinha linha direta com Bolsonaro, independentemente do ministro da Defesa (Fernando Azevedo e Silva) ou do comandante do Exército, Edson Leal Pujol. E essa intimidade vinha desde a campanha. Era o mais entusiasmado cabo eleitoral de Bolsonaro nos quarteis. E isso significa que a política já estava no chamando ambiente castrense bem antes de Ramos assumir a articulação do governo.

É evidente, e só não vê quem quer fazer o jogo do contente, que isso torna parte da tropa mais fiel a Bolsonaro do que às instituições. Sempre estou disposto a aprender, e alguém poderia indicar alguma outra democracia em que vige tal modelo. Como não há, agora aguardo os ensaios que expliquem que temos o nosso jeito de fazer samba, bossa nova, capoeira e democracia.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.