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Reinaldo Azevedo

Ex-parceiro objetivo de bandido, deputado oferece R$ 10 mil por um cadáver

Reinaldo Azevedo

13/09/2019 08h28

Capitão Assunção no momento em que oferecia R$ 10 mil por um cadáver. Na tribuna (Foto: Reprodução)

A liberdade de expressão pode tudo?

A imunidade parlamentar permite o cometimento de crimes?

Eis uma boa hora para debater essas questões. O deputado estadual Capitão Assunção (PSL), usou a tribuna da Assembleia Legislativa do Espírito Santo na tarde de quarta para, envergando um uniforme da PM, encomendar a morte de um homem. Não parou por aí: prometeu pagar R$ 10 mil a quem decidir ser o mandante da morte. Ele só fez uma exigência: quer ver o corpo.

O cadáver encomendado é o do assassino da jovem Maiara de Oliveira Freitas, assassinada naquele mesmo dia na cidade de Cariacica. A fala foi transmitida ao vivo pela TV da Assembleia, durante debate sobre a criação do Fundo Penitenciário do Espírito Santo.

Afirmou:
"Quero ver quem vai correr atrás para prender esse vagabundo. [Eu tiro] 10 mil reais aqui do meu bolso para quem mandar matar esse vagabundo, isso não merece tá vivo não. (…) Não vale dar onde ele está localizado não, tem que entregar o cara morto, aí eu pago".

O assassino de Maiara é flor que se cheire? Não! É um assassino! Um criminoso! Um bandido. Cabe à Polícia prendê-lo.

Ouvido nesta quinta, o deputado disse não estar arrependido. Ele acha legítimo e legal que um deputado estadual financie a contratação de um matador.

É o espírito da milícia encarnado num parlamentar.

Segundo o caput do Artigo 53 da Constituição, "os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos." A regra vale para os parlamentares das demais esferas.

Vamos pensar. Será que o espírito da Carta autoriza, então, o cometimento de crimes?

A Primeira Turma do STF já decidiu que não! Jair Bolsonaro é réu duas vezes no Supremo por ter afirmando que não estupraria a deputada Maria do Rosário porque ela não merecia porque ele a considera feia.

Se liberdade de expressão e imunidade pudessem tudo, então estes seriam os novos nomes de Deus.

A imunidade serve ao exercício do mandato. Não fosse assim, um parlamentar poderia usar a tribuna para, deixem-me ver, estimular a pedofilia ou propor ações terroristas.

Capitão Assunção já cometeu crimes ainda que ninguém venha a ser morto em razão de sua fala. Incidiu nos Artigos 286 e 287 do Código Penal, a saber:
286 – Incitar, publicamente, a prática de crime:
Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa.

Art. 287 – Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime:
Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa.

Se o assassinato acontecer, pode ser acusado também com base no Artigo 29:
Art. 29 – Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

A QUE PONTO!
Vejam a que ponto chegamos!

A Assembleia Legislativa do Espírito Santo terá de decidir se permanece uma casa do povo ou vira valhacouto de milicianos.

Segundo o Regimento Interno, "o uso de expressões em discursos ou em proposições, ou a prática de ato que afete a dignidade alheia, desde que configurados crimes contra a honra ou contenham incitação à prática de crimes, consideram-se atentatórios contra o decoro parlamentar".

Pronto! Tem de ser cassado por quebra do decoro quem nem deveria ter sido eleito.

Se não for por esse caminho, é preciso que o Ministério Público o denuncie pela penca de crimes que cometeu com sua fala abjeta. Crimes, que fique claro, que não estão ligados ao exercício da sua função. Ou está entre as tarefas de um deputado estadual o financiamento de matadores?

O deputado tem de ser processado e condenado. Por esse caminho, também pode perder o mandato.

"Ah, é que ele não gosta de bandidos!!!"

É mesmo?

Em 2017, ele ficou preso por quase 10 meses por liderar a greve dos policiais militares no Espírito Santo.

Quem lidera greve de policiais expõe a população aos bandidos. Logo, não passa de parceiro objetivo… de bandidos.

Antes de tentar me processar, excelência, tente saber o que significa "parceiro objetivo".

E banditismo é também o que ele praticou na Assembleia.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.