Parlamentar pode chamar presidente de “vagabundo”? Não deve, mas pode!
O presidente Jair Bolsonaro estaria pensando em acionar a Advocacia Geral da União contra o Delegado Waldir (GO), líder do PSL na Câmara, que o chamou de "vagabundo". E agora duas vezes: na reunião com membros do partido — ocasião em que sua fala foi gravada por um colega de partido — e em entrevista ao Estadão.
Será desperdício de recursos públicos.
Define o Artigo 53 da Constituição:
"Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos."
Eu estou entre aqueles que acham que a imunidade parlamentar existe para assuntos relativos ao mandato e aos embates políticos. Não pode servir de biombo para o cometimento de crimes.
Bolsonaro é réu em duas ações no Supremo por ater afirmado que não estupraria a deputada Maria do Rosário porque ela não merecia. Além de ser, segundo suas palavras, feia. A Primeira Turma do Supremo considerou que está configurada aí, e eu concordo, apologia do estupro.
Foi denunciado uma segunda vez por racismo. Numa palestra na Hebraica do Rio, disse: "Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais." Dessa vez, a denúncia foi recusada. Fosse eu membro do Supremo, teria aceitado.
Qual é a tese central de sua defesa nos dois casos? O Artigo 53 da Constituição! Já presidente, antes de fazer a sua indicação para a PGR, deixou claro que escolheria alguém que, segundo suas palavras, respeitasse o… 53.
Não acho que parlamentares devam se referir ao presidente da República nesses termos. Mas resta evidente que o Delegado Waldir, ele sim, está coberto pela imunidade. Sua fala é injuriosa? É claro que sim! Mas, por óbvio, inexiste a apologia do crime que fez de Bolsonaro um réu.
Recorram à Internet para lembrar a coleção de insultos a Lula e a Dilma que o agora presidente colecionou quando deputado. E sempre saiu ileso. Só virou réu quando fez apologia de um crime, licença de que, entendo, não gozam os parlamentares.
A coisa tem lá a sua graça trágica. O rei da ofensa e da agressão verbal agora quer processar o aliado de véspera porque não suporta uma dose mínima do veneno que ele sempre destilou contra adversários.