Texto que, em parte, caducou porque fazia leve elogio à fala de Bolsonaro
Vejam a imagem e o texto abaixo. Fiz questão de mantê-lo no blog para evidenciar por que é uma perda de tempo apostar que o presidente brasileiro possa ter algum bom senso. Não tem nenhum. Explico tudo no post acima.
O TEXTO QUE NÃO VALE NA PARTE QUE TRATA DA PRUDÊNCIA DE BOLSONARO. O RESTO VALE.
Ainda que em fragmentos de declarações, parece que o presidente Jair Bolsonaro decidiu baixar um pouco o tom beligerante sobre recentes eventos do subcontinente sul-americano, onde se encontra o Brasil. Há uma inquietação política soprando na região, ainda que as causas e os acontecimentos tenham naturezas diversas. Mas todas se combinam em favor da incerteza. Então a prudência recomenda não pôr lenha na fogueira — no caso do Chile, por exemplo, isso pode ser bem mais do que uma metáfora.
Os paranoicos, a soldo ou não, que formam a base do presidente nas redes sociais, já definiram um responsável por todos os eventos recentes que andam sacudindo a região: o Foro de São Paulo, claro!, tratado como se fosse um ente de razão a ditar a vontade da população em diferentes países. A tese não vale uma nota de R$ 3 com que o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), filho do presidente e líder da hora do PSL, ilustrou a imagem de sua colega de bancada Joice Hasselmann (SP), ex-líder do governo no Congresso e agora desafeta explícita.
O tal Foro, diga-se, está no centro da guerrilha interna na base bolsonarista nas redes. Os que seguem fieis às teses paranoicas de Olavo de Carvalho, sustentam que a, digamos, holding de partidos de esquerda manipula os protestos no Chile, dá suporte à vitória do kirchnerismo na Argentina, manipulou os protestos no Equador, teria ajudado a fraudar as eleições na Bolívia e, sei lá, talvez esteja se preparando para violar as urnas do segundo turno no Uruguai.
O dissidência de extrema-direita da extrema-direita, agora criticada por Carvalho, pode até concordar com tudo isso, mas acha mesmo que o Foro atua em outro lugar: estaria por trás da aprovação da lei que pune abuso de autoridade no Brasil; da indicação, pasmem!, de Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República; da recusa à CPI da Lava Toga; da possível vitória no Supremo do princípio constitucional da presunção de inocência; da liminar concedida por Dias Toffoli, que ainda será submetida ao pleno, que suspendeu inquéritos que usam quebra de sigilo de órgãos de controle sem a necessária autorização judicial.
Aí você tem o direito de perguntar: "Reinaldo, na sua opinião, onde, afinal, atua o Foro de São Paulo? Nas questões político-eleitorais do continente ou nessas miudezas que têm a ver com o ordenamento constitucional e legal do Brasil?"
A resposta é simples: em lugar nenhum! Isso é apenas delírio, com graus diversos de malandragem. Varia da estupidez literalmente gratuita — constituída por trouxas que disparam tolices na Internet para outros ainda mais tolos que eles próprios — à pilantragem remunerada. Por incrível que pareça, o anticomunismo ainda serve para arrancar grana dos idiotas. Larápios bem-falantes conseguem ganhar uma fortuna vendendo a incautos citações, falsas evidências e bibliografia que nunca lerão sobre os planos mirabolantes das esquerdas para dominar o mundo.
Em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, o presidente brasileiro falou sobre as eleições na Bolívia e na Argentina. Preferiu a moderação. A gente nunca sabe, no entanto, se isso é uma escolha, a indicar uma tendência, ou apenas uma distração.
Afirmou sobre o primeiro país: "A OEA, a meu ver, tomou uma decisão acertada, pedindo a revisão da contagem de votos. Nós queremos, sim, que a Bolívia permaneça um país amigo nosso, temos negócios com eles, em especial o gás, mas não abrimos mão da questão democrática".
Observadores da OEA e da União Europeia e o próprio Brasil defenderam a realização de um segundo turno. Evo Moraes, reeleito para um quarto mandato, disse concordar com uma auditoria independente, acenando com um improvável segundo certame caso surjam provas de fraude.
Neste domingo, a Argentina elegeu Alberto Fernández presidente do país, tendo Cristina Kirchner como vice. Na semana passada, Bolsonaro disparou a maior de todas as bobagens sobre o país vizinho, depois de ter afirmando reiteradas vezes que a derrota de Maurício Macri representaria, claro!, a volta da turma do Foro de São Paulo. Ameaçou, sem dizer como o faria, afastar os argentinos do Mercosul. Deu a entender que o Brasil poderia, se fosse o caso, romper com bloco.
Diante do inevitável, afirmou neste domingo: "Da nossa parte, pretendemos ampliar qualquer comércio com a Argentina".
Isso quer dizer que o governo Bolsonaro decidiu ter juízo nas relações internacionais? Todos as vezes em que alguém fez tal aposta quebrou a cara. Espero que sim! O Mercosul é o principal destino de exportação da nossa indústria. Embora o Brasil tenha diminuído substancialmente a importação de gás da Bolívia, o combustível é essencial para a economia brasileira.
De resto, voltamos ao começo: a política na América do Sul é hoje mais hostil aos valores que Bolsonaro representa do que era há 10 meses. Prudência nunca fez mal nessa área. Os dias dirão se a moderação deste domingo é uma escolha ou só um espasmo de bom senso.