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Reinaldo Azevedo

PSDB, por ora, fica na base; elevo a turma de frango a tucano, mas com bico ainda avariado

Reinaldo Azevedo

13/06/2017 04h51

Ilustrei ontem um post sobre os tucanos, neste blog, com um estranho frango depenado. O tucano, embora bicho meio esquisito — convenham que não merece um prêmio de design e proporção —, é coisa mais garbosa do que aquilo. Eu tratava, em especial, da pressão de setores do partido para deixar o governo Temer. A marquetagem apelidou a turma de "cabeças negras"… Seriam os jovens do partido. Calma lá! Ontem, na TV, eu vi, de fato, um "cabeça negra" a pregar o rompimento. Era o senador Ricardo Ferraço (ES), que é tucano há apenas um ano e três meses, oriundo do PMDB. De fato, tem cabelos mais negros do que os de Iracema, de José de Alencar, que, por sua vez, competia com "as asas da graúna". Mas aquilo é tintura, certo? O doutor tem 53 anos. A juventude hoje em dia se estende bastante, mas vamos com calma. Já nos bastam nossos adolescentes de 30 e poucos.

Bem, depois de uma reunião com lideranças nacionais, a tucanada decidiu permanecer na base. Não vai entregar os cargos. Mas há quem diga que, se o procurador-geral da República apresentar uma denúncia contra Michel Temer, aí a legenda teria de rediscutir o apoio. Bem, Rodrigo Janot vai fazê-lo. Derrubar Michel Temer passou a ser uma espécie de objetivo estratégico e tático. É tático, é de curto prazo, porque ele quer ser reconduzido à PGR sem disputar as eleições do dia 26 próximo, que acontece na ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República). Se Temer cair, a depender do substituto, Janot se impõe como o "nome natural". Ainda volto ao tema. E é estratégico porque a eventual deposição do presidente implicaria o triunfo de uma tese; todos os políticos e partidos são iguais, e a única salvação do Brasil é o Ministério Público Federal. Como um Luís XIV pançudo, Janot diria: "L'etat c'est moi".

Assim, condicionar a permanência no governo a esse ou àquele aspectos da ação da turma "derruba-Temer" é, com o devido respeito, obra da delinquência intelectual. O líder do partido na Câmara, Ricardo Tripoli (SP), indicou que deve orientar a bancada a aceitar eventual denúncia contra o presidente. Disse: "O PSDB vai colaborar para que esses fatos sejam elucidados para toda a população brasileira, essa é uma obrigação nossa". Santo Deus! Ele nem conhece a denúncia ainda.

O único papel sensato que cabe aos tucanos, hoje em dia, é defender as leis, as instituições e o respeito ao ordenamento jurídico. Em vez de acender velas para Rodrigo Janot, deveriam é questionar, sim, os métodos empregados pelo Ministério Público Federal; deveriam é recorrer aos instrumentos legais necessários, com a devida pressão política, para rever os termos da delação premiada de Joesley Batista.

Empegando certo tonzinho de indignação, alguns comentaristas, especialmente na TV, dizem que o PSDB decidiu ficar no governo em razão de algumas circunstâncias vividas pelo partido. Uma delas atende pelo nome de Aécio Neves, senador de Minas que caiu nas malhas de Janot, num dos flagrantes armados como parte da estratégia de delação premiadíssima de Joesley. Assim, dizem, Aécio poderá precisar do PMDB num eventual processo no Conselho de Ética. Huuummm… Ainda que assim fosse, o que há de errado nisso? Mais: Temer é alvo da PGR? É, sim! Mas também o são o senador José Serra, o governador Geraldo Alckmin e o ministro Aloysio Nunes. E aí?

Também se emprega certo acento de censura ao fato de que, ora, ora, Alckmin e João Dória, por exemplo, atuaram contra a saída porque, pré-candidatos que são, estariam de olho no apoio do PMDB em 2018. Sei. Fosse isso em vez daquilo ou a combinação das duas coisas, o que há errado numa e noutra?

Até porque, vamos convir, o senador Tasso Jereissati (CE) defende o rompimento com o governo, mas o apoio às reformas — esta brilhante quadratura do círculo — também em razão de estratégias, não? Ele é considerado uma alternativa de peso em caso de eleições indiretas. Seu nome foi defendido até pelo pré-presidenciável Ciro Gomes, antigo aliado, depois quase desafeto e hoje, em termos políticos, um neoficante.

Ou por outra: em política, todos agem em razão de interesses. E não há mal nenhum nisso desde que se respeitem as leis. Os puramente altruístas são os santos. Mas não disputem eleição.

Na ilustração deste texto, tucanos deixaram de ser frangos e voltaram a ser tucanos. Mas ainda com o bico remendado.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.