Topo

Reinaldo Azevedo

Temer tem de cortar cargos de infiéis. Ou: PSDB vai pavimentar de novo caminho para o PT?

Reinaldo Azevedo

22/06/2017 07h53

"Oh, parem as máquinas!", dir-se-ia ao tempo em que as máquinas tinham um peso relativo na definição da verdade muito maior do que agora. E não é que o Planalto decidiu cobrar lealdade, afinal, de quem é base do governo? Estou enganado ou, aqui e mundo afora, governos costumam, bem…, governar com aliados? O senador Hélio José (PMDB-DF), que votou contra a reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais, viu a demissão de dois apadrinhados seus. É, queridos, fazer o quê? Parte da imprensa chama isso de fisiologia. Chamo de realismo.

Ou seremos do tipo que cobra reforma trabalhista, política e da Previdência, mas acha que isso tudo se consegue estalando os dedos? Não! É preciso ter maioria no Congresso. No caso das duas primeiras, são necessários 60% dos votos em cada Casa, em duas votações. Não quero ser muito contundente no argumento, mas lembro que, às vezes, em vez dos dedos, é preciso estalar o chicote.

"Ah, esse governo não tem como pressionar ninguém…" Bem, é o que se vai ver, não é mesmo?

O esquisito Hélio José vociferava ontem numa sintaxe de exceção… Dizia-se, ora vejam, chantageado pelo governo. Ah, que belezuca! Esse é o cara que, em agosto de 2016, ao defender a indicação de um ex-assessor para o cargo de superintendente da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) no Distrito Federal, disparou a seguinte pérola: "Isso aqui é nosso. Isso aqui eu ponho quem eu quiser, a melancia que eu quiser aqui, eu vou colocar".

Bem, se não quiser ser um banana, o senador terá de ser uma melancia mais disciplinada.

O governo também quer saber que diabos, afinal, pretendem o PSD e o PSDB de sempre. Otto Alencar (PSD-BA), que atuou firmemente contra o impeachment, disse "não" à reforma trabalhista, a exemplo de outro parlamentar da base: o tucano Eduardo Amorim (PSDB).

São casos diferentes. O PSD, do ministro Gilberto Kassab (Comunicações), reproduz, desde a origem, a heterogeneidade de um PMDB, que é seu espelho bastante ampliado. O voto de Alencar, embora incômodo, não surpreendeu. Já o de Amorim…

O PSDB é hoje o partido mais confuso do país. Quando tenta ter convicção, falta-lhe coragem. Quanto tenta ter coragem, falta-lhe convicção. Pior: é uma legenda que trata Michel Temer como metáfora. O que quero dizer com isso? A ala que quer o rompimento com o governo, mas não com as reformas (podem rir!), reúne os tais "jovens" e conta com o apoio do senador Tasso Jereissati (CE), presidente interino da legenda. Muito bem! Romper por quê? "Ah, por causa das denúncias…" É mesmo? Isso significa, por exemplo, a expulsão do senador Aécio Neves (MG), presidente da legenda até anteontem, sem nem lhe dar nem o direito de se defender?

Porque, vamos convir, é disto mesmo que se trata: se o PSDB não pode conviver com Temer por causa das acusações que há contra o presidente, como vai conviver com Aécio? Com a devida vênia, não é a coragem que move o tucanato que quer bater em revoada. É a covardia. Já lembrei aqui: os emplumados jogaram seu ex-comandante na boca do sapo; o PT elegeu a senadora ré Gleisi Hoffmann (PR) presidente da sigla.

Não! Eu não acho que o PT seja um exemplo a ser seguido.

Mas eu acho que o PSDB, com esse comportamento, também não é.

Essa história de que rompe com o governo, mas não com as reformas, é conversa pra tucano dormir. Até porque o tal Amorim votou, sim, contra o governo, mas o fez votando contra a reforma.

Acho lamentáveis e absurdamente equivocadas determinadas posições e opiniões, incluindo as de Fernando Henrique Cardoso, por quem tenho enorme respeito político e intelectual. Defender, no entanto, a renúncia do presidente Michel Temer e a antecipação de eleições, a esta altura do jogo, é uma dessas coisas que nem erradas conseguem ser. Tanto é que, desde logo, o tucano tem um companheiro e tanto de luta: ninguém menos do que Lula. É precisamente o que pedem o PT e os demais grupamentos de esquerda.

PSDB em crise de identidade não é exatamente uma novidade. A despeito dos enormes serviços prestados pela sigla ao país, e eu os reconheço, deve-se também a esse descasamento permanente entre convicção e coragem, com as exceções de sempre, a hegemonia que o PT conquistou e manteve por largo tempo na política.

Só há um papel decente a desempenhar na atual quadra da vida política do país — caso, obviamente, a pessoa não seja uma militante de esquerda, interessada em fazer avançar a agenda do conflito social, que, na cabeça intelectualmente pervertida dos vermelhos, conduz ao progresso. E esse papel compreende quais ações? Apoio às reformas. Repúdio a golpismos. Defesa intransigente do Estado democrático e de direito, o que compreende a exigência de que órgãos de investigação se comportem nos limites da lei.

Ficar boquejando contra o governo, a esta altura, mistura, com a devida vênia, em doses iguais, oportunismo e burrice. Por oportunistas, querem se livrar de qualquer ônus de ser governo. Por burros, pavimentam, mais uma vez, o caminho para as esquerdas.

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.