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Reinaldo Azevedo

Aécio: 3 dos 5 ministros da 1ª Turma rasgam o Código de Processo Penal e a Constituição

Reinaldo Azevedo

26/09/2017 22h55

Barroso, o homem da gravata vermelha, abriu a divergência rumo ao absurdo

Por cinco a zero, a Primeira Turma do Supremo recusou a prisão preventiva do senador Aécio Neves (PSDB-MG). O pedido, desde sempre, afigurou-se absurdo. Não porque eu quero, mas porque assim determina o Artigo 53 da Constituição, no Parágrafo 2º:
"Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão."

E quais são os crimes inafiançáveis? São aqueles considerados hediondos. Ainda que as razões que levaram ao pedido de prisão feito por Janot se comprovassem verdadeiras, nem houve flagrante nem eram os crimes inafiançáveis. E aqui começa o problema, grave, que remete, lá vai a expressão que irrita muita gente, ao "estado de direito".

Três dos cinco ministros — Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux — decidiram impor medidas cautelares de extremo rigor ao senador: ele foi afastado do mandato e deve manter recolhimento domiciliar. Marco Aurélio, o relator, e Alexandre de Moraes se limitaram a cumprir a Constituição: os motivos para prisão não estão dados e ponto.

Estamos diante de um dos maiores absurdos da história do tribunal. E notem que não estou aqui a julgar se Aécio é culpado ou inocente. Nem o tribunal chegou ao ponto do julgamento, embora Barroso, Rosa e Fux tenham se antecipado e emitido juízo de condenação.

Comecemos do básico. Não se prende preventivamente uma pessoa segundo a vontade do juiz. As razões estão dadas no Artigo 312 do Código de Processo Penal: 1) preservação da ordem pública; 2) da ordem econômica; 3) no interesse da instrução criminal ou 4) para que se aplique a lei penal (iminência de fuga). Não! O 312, como já vimos, não se aplica aos parlamentares, o que está correto, diga-se. É uma medida prudencial para evitar eventuais perseguições políticas.

E, observem, lá no alto, o conteúdo do Parágrafo 2º: ainda que o parlamentar seja preso nas condições previstas, o plenário da Câmara ou do Senado pode reverter a decisão. Isso renderá outro post, que vai dar samba. Se algo lhes pareceu confuso até aqui, releiam o texto.

Atenção! As medidas impostas a Aécio estão no Artigo 319 do Código de Processo Penal, que reúne as ações cautelares ALTERNATIVAS à mais grave de todas elas: a prisão preventiva. Isso quer dizer o seguinte: sem que haja motivos para a preventiva, não pode, por óbvio, haver motivos para as imposições que a substituem. Isso também está explicitado no Código de Processo Penal, no Artigo 282, Parágrafo 6º. Transcrevo:
"A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar".

Isso evidencia que os dois Artigos são inseparáveis. Ou bem se aplica a ação cautelar extrema do 312, a preventiva, ou bem se aplicam as ações mais amenas, previstas no 319. Ou ainda: o 312 deve ser aplicado quando o 319 se mostrar insuficiente; o 319 só pode ser aplicado quando, num juízo mais severo, couber o 312.

Uma pergunta de resposta óbvia: Aécio poderia ter sido preso preventivamente? Cabia a ele a cautela extrema do Artigo 312? A resposta é "não"! Parlamentares têm uma proteção constitucional especial — que é, reitero, correta. Ora, se não cabe um, como aplicar o outro?

Trata-se de uma aberração. E esteve longe de ser a única. Ao justificar seus respectivos votos, Barroso, Rosa e Fux, cada um segundo o seu estilo e escolha, violaram o Código de Processo Penal, como resta evidente; cometeram prejulgamento e ignoraram as prerrogativas constitucionais daquele que nem ainda é réu. No caso de Fux, houve um comportamento lastimável adicional: resolveu fazer ironia com aquele que era alvo de seu julgamento.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.