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Reinaldo Azevedo

Como? STF é bem mais lento do que Moro? Opa! Leiam direito! É o MPF que não apresenta as denúncias. Vai ver lhe faltam as provas!

Reinaldo Azevedo

29/01/2018 07h09

Quem ler sem a devida atenção reportagem da Folha publicada nesta segunda acabará comprando gato por lebre. Ficará com a impressão que de que o Supremo reúne mesmo um bando de procrastinadores e militantes da impunidade, em contrate com o juiz Sérgio Moro — este, sim, um primor de eficiência. E, pior ainda será — e a matéria não tem esta questão como objeto — se o vivente achar que a agilidade de Moro, que só cuida de Lava Jato, é o padrão da primeira instância. Fosse assim, este seria um país da justiça a jato, mas ela anda na velocidade de uma carroça, certo? Adiante.

Lê-se na reportagem da Folha:
"Anunciada como a "delação do fim do mundo" por provocar uma limpeza no meio político do país, a colaboração da empreiteira Odebrecht completará um ano no Supremo Tribunal Federal na terça-feira (30) sem nenhum político tornado réu, nenhum preso e apenas um denunciado (1% do total investigado).
Dos 83 inquéritos abertos no STF para investigar parlamentares de vários partidos, 78 (94%) estão inconclusos. As suspeitas contra cinco parlamentares, no bojo de quatro inquéritos, já foram arquivadas por prescrição da pena.
O cenário não é diferente no Senado e na Câmara, que tiveram dezenas de seus membros acusados pelos delatores. As duas casas não investigaram nem puniram nenhum parlamentar com base nas delações da empreiteira.
Em 30 de janeiro de 2017, a presidente do STF, Cármen Lúcia, homologou o acordo de delação que vinha sendo negociado desde meados de 2016 pela equipe do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Era um momento tenso porque, apenas 11 dias antes, o relator da Operação Lava Jato no STF, Teori Zavascki, havia morrido em um acidente aéreo e não se sabia quem seria seu substituto na relatoria.
Em março, a PGR (Procuradoria-Geral da República), que tem o controle da investigação, protocolou as petições que deram início aos inquéritos que ficaram conhecidos como "segunda lista de Janot" ou "lista de Fachin".
Passado um ano, a consequência jurídica é próxima de zero no STF. Por exemplo, dois dos principais investigados eram o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia(DEM-RJ). Até o momento eles não são réus nem sofreram qualquer sanção judicial.
"

Retomo
Quem leu a reportagem só até aí — e suspeito que já implica ir além do que se faz normalmente — vai se revoltar com o STF, certo? Pois é… Será por maus motivos.  O essencial da reportagem, que eu teria mandando para o lead e o para o título está nesta informação, que vou transcrever em maiúsculas, com negrito:
"A ÚNICA DENÚNCIA APRESENTADA PELA PGR, CONTRA O SENADOR ROMERO JUCÁ(MDB-RR), ESTÁ DESDE AGOSTO SEM DECISÃO NO STF. O TRIBUNAL PRECISA DIZER SE HÁ INDÍCIOS MÍNIMOS DE AUTORIA PARA DAR INÍCIO A UMA AÇÃO PENAL, O QUE TORNARIA O SENADOR RÉU."

Entenderam? Daquela baciada de delações homologadas por Cármen Lúcia, certamente sem ler, só um caso se transformou até agora em denúncia. Se há morosidade, não é do STF, mas dos órgãos de investigação, incluindo o Ministério Público Federal — a PGR em particular.

Aí a reportagem da Folha cita três casos — três em 87 — que exporiam a "morosidade" do tribunal. Bem, seria preciso analisar cada um. Morosidade em relação a quê?

Confusão
Há um parágrafo que pode acrescentar uma baita confusão ao conjunto da obra:

"A velocidade para o acolhimento de uma denúncia nos casos da Lava Jato é bem diferente na primeira instância. O juiz Sergio Moro, de Curitiba, por exemplo, gastou em média 3,5 dias para decidir sobre a abertura da ação penal em dez dos principais casos da operação."

Bem, dado o que se informou, não há dúvida de que Sérgio Moro é rápido…. Mas notem que ele só pode abrir ação penal com o oferecimento de uma denúncia. E, no caso do Supremo, o MPF (ou, se quiserem, a PGR) só ofereceu UMA DENÚCIA.

Para encerrar
Para encerrar, três indagações:

1: Na Justiça, no jornalismo ou na cozinha, celeridade é, por si, evidência de eficiência e qualidade? Um juiz que decide abrir uma ação penal em 3,5 dias (média) terá lido com atenção os autos ou terá decidido abrir a Ação Penal primeiro para ver no que dá depois?;

2: e se as homologações tiverem se dado com base em delações capengas? Não tenho dúvida de que PF e MPF estão doidinhos para apresentar as suas provas, tentando mandar todo mundo para a cadeia. Mas vai ver que a coisa está difícil, não?

3: uma questão mais geral, que vale para este post e este tema e, a rigor, para todos os posts e todos os temas: uma Justiça que absolve, nestes nossos dias, também pode ser justa? Ou ela tem de necessariamente condenar para ser eficiente?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.