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Reinaldo Azevedo

Ai, ai, agora é a esquerda a vir com essa história de “Lula vai ser preso amanhã”... Se for uma tática, é coisa de energúmenos

Reinaldo Azevedo

06/02/2018 00h33

Lula: agora são seus companheiros que falam em uma data para a prisão. Não parece ser uma coisa esperta

O ex-presidente Lula pode ser preso na semana do dia 19 de fevereiro, como dizem militantes esquerdistas? Não vejo como e não sei de onde tiraram esse troço. Por que afirmo isso? Já chego lá.

A Frente Brasil Popular, que junta o PT e movimentos de esquerda, reuniu-se nesta segunda, com a presença da senadora Gleisi Hoffman (PR), presidente do PT, para distribuir, como se diz em "militantês", o "calendário de lutas" deste e do próximo mês. As pautas principais: combate à reforma da Previdência e resistência ao que seria uma campanha de perseguição a Lula. Bem, até aí, vá lá, cada uma na sua. Se a Frente Brasil Popular pensasse o que eu penso, seria uma frente de pensadores e militantes liberais, né? Em vez de fazer repto contra a reforma da Previdência, a turma estaria pegando no pé dos nababescos benefícios dos juízes e dos membros do Ministério Público. Mas, nesse particular, eles estão todos juntos… Que mundo!

Sigamos.

Bem, os petistas e companheiros afins marchem a favor do que lhes der na telha, mas gostaria aqui de lembrar algumas coisas. Os desembargadores do TRF-4 que julgaram o recurso de Lula foram explícitos: determinaram, conforme jurisprudência atual do Supremo, a execução da pena — no caso, a prisão de Lula — depois de esgotados os recursos àquele tribunal. Ora, os recursos, na verdade, se resume aos embargos de declaração.

Ocorre que estes têm de ser apresentados, no máximo, dois dias depois da publicação do acórdão, que é a redação da decisão tomada pelo tribunal — no caso, pela turma. Está a cargo de Gebran Neto, o relator, cujo voto foi o vencedor — com a adesão integral dos outros dois desembargadores: Leandro Paulsen e Victor Laus.

Em ofício ao STJ, Gebran Neto havia dito que publicaria o acórdão na semana passada. Até esta segunda, nada! Digamos que o faça nesta terça. A defesa de Lula terá até o dia 8 para entrar com os embargos de declaração. O tempo estimado para a resposta é de dois meses. Ou será que o TRF-4, mais uma vez, iria optar pela exceção e decidir num prazo entre 11 e 15 dias?

Será que algum outro juiz, em outro processo, resolverá pedir a prisão preventiva? Mas agora? Com base em quê? Esse troço parece não fazer nenhum sentido, mesmo nestes dias estranhos em que vivemos, em que juízes dizem abertamente, contrariando o texto da lei, que auxílio-moradia é, na verdade, uma forma de aumentar salário… Ao se constatar tal coisa, a gente até pode achar que, então, tudo é permitido.

Talvez haja nessa cascata um tanto de cálculo xucro. Afinal, não se imagine que apenas a direita conta com suas facções escoiceadoras e, se me permitem o neologismo, "zurrantes". A esquerda não a deixa passar vergonha sozinha. É possível que esse papo sirva apenas para manter a mobilização dos companheiros, entendem? "Vamos insistir em que Lula pode ser preso porque, assim, todos ficam vigilantes".

Se for isso, trata-se de uma tática de energúmenos porque esse tipo de boato contribui para naturalizar a eventual prisão, não para evitá-la. Até porque, se assim determinar a Justiça, Lula será preso, e não há nada que a militância possa fazer. Pode até haver uma tentativa de confronto aqui e ali, mas nada relevante.

A decisão, no fim das contas, será mesmo da segunda turma do Supremo, a menos que haja antes um novo entendimento da Corte sobre a prisão depois da condenação em segunda instância. A jurisprudência em curso, decidida por 6 a 5, permite a execução da pena, mas não a obriga. Fica a cargo do colegiado de desembargadores. Um eventual novo entendimento do tribunal pode resolver reasgatar, vejam que exótico, o que está no Inciso LVII do Parágrafo 5º da Constituição, a saber:
"Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

Deve ser um dos trechos mais claro do nosso cartapácio constitucional. Ninguém quer dizer "ninguém"; culpado quer dizer "culpado", e trânsito em julgado quer dizer que "não há mais recurso possível".

Assim, ainda que o Supremo decida estuprar a Constituição uma segunda vez, sempre caberá o habeas corpus. A razão é simples: a execução da sentença após o julgamento em segunda instância é uma antecipação da pena. Trata-se, na prática, de uma prisão preventiva, só que não ancorada no Artigo 312 do Código de Processo Penal. Se é assim, o Habeas Corpus continua a ser um recurso à mão.

Para encerrar: agora é a esquerda que vai começar com a história de que "Lula vai ser preso amanhã"?!

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.