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Reinaldo Azevedo

Falsa pré-candidatura de Huck deu à luz estranha fusão de assessoria e jornalismo; híbrido nem faz assessoria nem informa

Reinaldo Azevedo

16/02/2018 04h09

Sabem a importância que tem a "desistência" de Luciano Huck de concorrer à Presidência da República? Nenhuma! A rigor, ele nunca foi candidato. E não havia uma só articulação entre centristas e direitistas que dependesse da Inês de Castro da Rede Globo, aquela que foi sem nunca ter sido.

Já afirmei neste blog que parte considerável do jornalismo que cobre política e dos comentaristas atuava assessoria de imprensa de Huck. Uma coisa é certa: seus "articuladores", digamos assim, souberam fazer escolhas certas para transformar o homem em notícia. Só é uma pena para ele próprio e para aqueles que caíram na conversa que também as informações que não eram do interesse do apresentador tenham ganhado curso e caído na vida.

Venham cá: exceção feita a FHC e a um núcleo de economistas desencantados com o PSDB — embora tucanos também nunca tenham sido —, alguém no partido esperou a definição de Huck para fazer as suas escolhas? E no DEM? Por acaso o "impasse" Luciano Huck condicionou, em algum momento, o caminho a ser adotado pelo partido? Poderia fazer uma ironia e dizer: olhem, o partido continua desencaminhado, com ou sem o marido da Angélica.

E qual era o impacto da pré-candidatura Huck no maior partido do país, o PMDB, agremiação a que pertence o presidente da República? A resposta: não chega a ser zero porque a questão simplesmente nem mesmo chegou a existir.

Li com alguma surpresa dia desses, já nem me lembro onde, que "o Planalto" — Ah, as metonímias do jornalismo! — dava como certa a candidatura de Huck. Nessas horas, sempre penso: "Deus do Céu! Quem será que está encarnando o Palácio do Planalto? Que pessoa — ou pessoas — é poderosa o bastante para poder falar pelo "Planalto", o que inclui o presidente da República e seu entorno.

Tentei saber se era Michel Temer. Não, o presidente nem sequer havia se ocupado da questão.

Seria Moreira Franco? Afinal, ele é secretário-geral da Presidência. Não. Ele também não. Tampouco Carlos Marun, da Secretaria de Governo. Estava de tal sorte ocupado de outras coisas que não teve tempo de saber se Inês de Castro seria ou não rainha. Vai ver o "Planalto" era Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, Mais um furo n'água. Também não era ele.

E cheguei à conclusão de que a candidatura de Luciano Huck era um balão de ensaio que só existiu em  certos nichos da imprensa, escolhidos a dedo. Não vai aqui nenhuma teoria conspiratória. Trata-se apenas de um jeito de fazer as coisas, ora essa. Eu, por óbvio, não fiz parte desse, como posso chamar?, "grupo experimental" porque, afinal de contas, não me presto a esse papel. Não vejo nenhuma diferença entre tal atuação e a pura e simples assessoria de imprensa. Ou talvez haja uma: a assessoria é remunerada; esta outra prática, até onde sei, não. O pagamento é feito com informações de bastidores irrelevantes, a que alguns têm acesso com exclusividade.

Por que alguém deve se satisfazer com a exclusividade da irrelevância? Não tenho a menor ideia.

A pré-candidatura de Huck nunca existiu. Era só um balão de ensaio, e alguns jornalistas prestaram o triste papel de personagens de um experimento, para ver se a coisa colava. Não colou. Huck percebeu que ficaria sem votos na política e ainda teria arranhada a reputação de bom moço da Família Doriana que construiu como apresentador.

Sabem a reação dos pré-candidatos que já estão postos? Nenhuma! Nunca ninguém levou a coisa a sério. E, como se vê, séria não era.

A falsa pré-candidatura de Huck deu à luz, em suma, a uma estranha experiência genética no mundo da comunicação que funde assessoria de imprensa não-remunerada com jornalismo. O monstrengo saído dessa fusão nem assessoria nem informa.

Serve apenas à torcida.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.