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Reinaldo Azevedo

PT paga por ter tentado um STF na medida de seu bolivarianismo light; seus vermelhos viraram heróis do reacionarismo brucutu

Reinaldo Azevedo

11/04/2018 05h49

Na era dos ódios insanáveis e das ignorâncias convictas, a afirmação a seguir tende a gerar algum barulho nos que odeiam com convicção: haverá o tempo em que o país será grato a Gilmar Mendes e alguns outros poucos bravos por manter acesa a lamparina — hoje, é apenas isso — do Estado de Direito. Nestas quarta e quinta, o Supremo viverá de novo dias agitados, tendentes a mobilizar o ódio burro, como todo ódio. Estão em pauta um habeas corpus para Paulo Maluf e outro para Antonio Palocci. O fenômeno que está em curso no Brasil não é fácil de entender, não. Quando vemos a direita e a extrema-direita a aplaudir uma ala do Supremo formada pelo PT — e pelo pior petismo — e a vaiar ministros indicados por presidentes que antecederam Lula, bem…, algo de especial está em curso. Quando menos, então, essas vozes do reacionarismo disfarçadas de liberais deveriam ser gratas aos ex-presidentes petistas por terem formado um tribunal tão a seu gosto, não é mesmo?

Só para relembrar: cinco dos seis ministros que negaram habeas corpus a Lula foram indicações de petistas. Cármen Lúcia saiu da mente divinal de Lula. Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber foram paridos da cabeça privilegiada de Dilma Rousseff. Só Alexandre de Moraes, indicado por Michel Temer, foge à regra. Dados os cinco que votaram a favor do habeas corpus, só dois foram nomeados no reinado lulista: Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Celso de Mello assumiu no governo de Sarney; Marco Aurélio, no de Collor, e Gilmar Mendes, no de FHC. Este último, porque não evita os confrontos, acaba atraindo com mais facilidade a fúria dos desinformados e dos idiotas. Isso não quer dizer que não possa haver restrições de boa-fé e eventualmente corretas ao que diz e faz. Eu me refiro, por óbvio, às manifestações de ódio a que se viram aqui e ali, estimuladas, desta feita, por pistoleiros identificados com a direita, que elegeram Barroso como seu herói.

O Supremo vive, creio, o momento mais delicado de sua história. As práticas que estão levando a uma esgarçamento da Constituição, infelizmente, nascem hoje na Corte. E isso deriva das feitiçarias feitas pelo PT, que sonhou ter uma corte suprema no país mais ou menos como Hugo Chávez tinha na Venezuela ou Daniel Ortega tem na Nicarágua. Nesse país, a Constituição proibia explicitamente a reeleição. "O Orelhudo", como o chamava Paulo Francis, não teve dúvida: pediu que uma corte suprema dominada por sandinistas declarasse inconstitucional o trecho da Constituição. E pronto! Ele pôde se candidatar de novo. E foi reeleito.

Ora, no Brasil, o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado corresponde a declarar inconstitucional um trecho da Constituição, como fez a corte subordinada a Ortega na Nicarágua. Ignorar o texto constitucional é prática de república bananeira. Ponto.

O petismo sempre foi muito mais light do que o chavismo ou o sandinismo, que é, por sua vez, menos virulento do que o regime venezuelano. Isso não quer dizer que o partido não tivesse suas frentes avançadas de, na cabeça deles, "desconstituição do conservadorismo". E o Supremo, isto é unânime entre juristas com miolos, tornou-se o abrigo de "representantes de causas".

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.