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Reinaldo Azevedo

Ana Amélia foi a escolha perfeita: é mulher, pertence a partido do Centrão, mas não é do Centrão, e tem a justa fama de política austera

Reinaldo Azevedo

04/08/2018 17h42

Internautas, ouvintes e telespectadores perguntam: "E a senadora Ana Amélia? Ajuda a candidatura de Geraldo Alckmin?"

Já tratei do assunto no rádio e volto ao tema. Eu acredito na máxima de que vice não dá voto — ou dá muito pouco —, mas pode tirar. Ou ter o condão de não tirar.

Uma boa escolha, assim, além de não atrapalhar, atua como escudo contra ataques óbvios. E o titular pode cuidar de outros assuntos que não seja ficar respondendo aos clichês dos adversários. Ana Amélia cumpre esse papel. Antes que avance, exemplifico.

Qual foi a serventia do "senador José Alencar" como vice de Lula em 2002? Do senador? Nenhuma. Já o "empresário José Alencar" foi fundamental. Quase ninguém o conhecia fora de Minas. Ocorre que Lula teve de fazer uma "Carta ao Povo Brasileiro" prometendo que não daria calote na dívida interna e que respeitaria as leis do mercado. Havia em certos nichos a suspeita de que o petista, se vitorioso, implementaria o socialismo no Brasil.

Socialismo em companhia de um dos maiores empresários do país?

Pronto! Alencar justificava a sua presença.

Aliás, há até uma nota irônica a respeito: segundo certos critérios, Alencar é que era "a esquerda" do governo Lula na área econômica. Passou boa parte do tempo criticando a política de juros do Banco Central.

E Ana Amélia?
A política vive sob o signo da Lava Jato, no bom e no mau sentido — mais no mau do que no bom, observo. Basta observar a crise política em curso. A senadora gaúcha, que tinha uma reeleição garantida, pertence a um partido, o PP, que lidera no número de implicados tanto no mensalão como no petrolão.

Contra ela, no entanto, nada existe! Ao contrário! Sua retidão moral é por todos reconhecida. E também seu conservadorismo no que respeita aos valores ideológicos. No Rio Grande do Sul, o PP tem uma feição muito particular: sofre uma forte influência do agronegócio, mas também de pequenos e médios produtores rurais.

Se fosse para "agregar eleitorado", Ana Amélia seria uma má escolha porque transita num faixa do eleitorado que já tende a caminhar ou já caminhou para Alckmin. Mas o objetivo é outro.

O que se quer é popularizar, agora fora do Rio Grande do Sul, a sua imagem — que corresponde, até onde se sabe, aos fatos — de austeridade. Convenhamos: a sua aparência física e seu discurso — convicto, mas nunca crispado — denotam esse valor. Mais de uma vez, a senadora já se mostrou uma admiradora entusiasmada da Lava Jato.

A escolha, dado esse quadro, não poderia ser mais virtuosa para Alckmin: recaiu sobre um nome que pertence a um partido do "Centrão", mas que não é do "Centrão". Os aliados não podem reclamar do desprestigio, mas também não tem encabrestada a vice.

Se os partidos aliados a Alckmin, com seus vários integrantes investigados pela Lava Jato, podem ter um peso negativo na opinião pública, a "vice incorruptível e mulher" entra para combater essa fonte de difamação da campanha.

Com Ana Amélia, Alckmin se protege desse tipo de suspeita. Já na convenção, em seu discurso, a senadora cumpriu a sua parte na narrativa:
"Quando aceitei o convite, tive a honra de dizer que quero contribuir modestamente porque a régua moral de Geraldo Alckmin é a mesma que sempre usei. Tenho a responsabilidade com o dinheiro do contribuinte. Gasto apenas 30% do que tenho direito em verba indenizatória. Nunca usei auxílio-moradia porque tenho minha casa. É isto o que o brasileiro quer: um governo austero, uma nova forma de mostrar que este país tem jeito. E o jeito é Geraldo Alckmin presidente."

Não tem como tirar voto do titular. E, contestando a teoria firmada a respeito, pode até trazer votos novos.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.