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Reinaldo Azevedo

COLUNA NA FOLHA: Moro como ministro de Bolsonaro constitui um exemplo assombroso de um ‘Judiciário Com Partido’. E isso é só um fato

Reinaldo Azevedo

02/11/2018 08h08

Sérgio Moro depois de encontro com Bolsonaro, em que aceitou cargo de superministro (Foto: Mauro Pimentel/AFP)

Leia trecho:

"Consummatum est"! Sergio Moro fulminou a classe política e sai como um dos dois grandes beneficiários da razia que promoveu. Já é o primeiro na fila de sucessão —quando Jair Bolsonaro quiser, bem entendido.

Não é "fake news". O futuro superministro da Justiça e agora ex-juiz encontrou-se com Paulo Guedes durante a campanha e recebeu o convite para chefiar um troço que faz o antigo SNI, mesmo em seus dias de esplendor, parecer brincadeira de criança. A conversa desta quinta com o presidente eleito foi uma formalidade. Alguém poderia objetar: "Não compare ditadura com democracia". Claro que não! Se, no entanto, num regime democrático, as leis são submetidas por togados a uma leitura de exceção, depois referendada por colegiados, cumpre que se questione qual é a diferença entre uma ditadura genuína e uma democracia degradada. Certamente as há. Mas nem um regime nem outro conduzem os países a um bom lugar.

Leitores desta coluna e do meu blog e os que me acompanham no rádio e na TV sabem que não tardou para que eu percebesse e apontasse que a Lava Jato era muito pouco reverente à Constituição e ao Código de Processo Penal. E isso para começo de conversa. Liberal, alinhado com o que entendo ser a direita democrática —ainda que seja esta, hoje, uma das vastas solidões do Brasil—, crítico severo das esquerdas e particularmente do petismo, passei a sofrer primeiro as restrições e depois o assédio moral daqueles que me viam como uma peça de propaganda de seus delírios autoritários.

Fazer o quê? Minhas convicções liberais me impõem o necessário formalismo no trato das questões de direito. Nego-me a transferir para demiurgos ou entes a arbitragem sobre a minha liberdade e a de meus adversários intelectuais. Meu herói nada secreto é o intelectual francês Raymond Aron.
(…)
Ocorre que o combate à corrupção —quem há de ser contra, exceção feita a seus beneficiários?— logo degenerou em ataque aos próprios fundamentos do estado de direito. Infelizmente, o enredo macabro se desenvolveu sob a vigilância rebaixada da imprensa. Passou a vigorar um certo "Padrão Witzel" de combate a criminosos do colarinho branco, reais ou supostos. Se é para pegar bandidos, procuradores e juízes podem atuar como "snipers", recebendo, por princípio, o que Bolsonaro chama "excludente de ilicitude".
(…)
Não há debates nos cemitérios. Mas os há nas universidades e escolas. Um lugar é, literalmente, a terra dos mortos. O outro é a vereda em que transitam os vivos. O Supremo deu uma resposta maiúscula àqueles que pretenderam usar a Lei Eleitoral, a 9.504, para rasgar os artigos 5º e 220 da Constituição, que garantem a liberdade de expressão, e o 207, que assegura a autonomia universitária. Ainda há juízes em Brasília. Tomara que resistam ao assédio daqueles que nos prometem um pouco mais de eficiência em troca de um pouco menos de liberdade.

Por uma Justiça Sem Partido!

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.