Moro 2 – Mensagem do ainda juiz a seus pares me remete a um poema de Gregório de Matos. E ela me parece um pouco ofensiva a seus pares
O ainda juiz Sérgio Moro me fez lembrar, nesta terça, trecho de um poema do baiano Gregório de Matos (1636-1695), em que se lê:
Valha-nos Deus, o que custa,
o que El-Rei nos dá de graça,
que anda a justiça na praça
Bastarda, Vendida, Injusta.
No caso, refiro-me às duas primeiras estrofes, sobre dar a alguém aquilo que já lhe pertence. A propósito, o nome do poema em questão é "Juízo anatômico dos achaques que padecia o corpo da República em todos os membros, e inteira definição do que em todos os tempos é a Bahia"
Por que a lembrança? Eu explico.
Moro enviou uma mensagem aos juízes federais pedindo que continuem dignificando a Justiça mesmo que isso signifique discordar do ministério que ele comandará. No texto enviado por um sistema de comunicação entre juízes, ele lembrou o caso do italiano Giovanni Falcone, que deixou processos contra a máfia Cosa Nostra, a mais famosa da Itália, para assumir o ministério da Justiça do país. O juiz disse que, caso tenha sorte, poderá fazer algo importante para o Brasil, sempre com respeito à Constituição, às leis e aos direitos fundamentais.
Vamos ver. Não se trata de má vontade, não. É preciso ser rigoroso nessas coisas.
a: ao fazer tal pedido, Moro parece reconhecer o risco de que seus pares, então, subordinassem a Justiça a um critério corporativista — "afinal, lá está um dos nossos"; não é lisonjeiro;
b: essa independência não é concedida por um ministro de Estado; é uma condição imanente ao juiz;
c: a memória de Falcone, ainda que heroica para um juiz que nunca teve o pecado da modéstia, também evoca uma tragédia, não?
Mesmo antes de assumir, recomendo a Moro que seja mais comedido.