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Reinaldo Azevedo

Leia a integra do discurso de Rosa Weber na diplomação de Bolsonaro: “Maioria e Minoria hão de conviver sob a égide da Constituição”

Reinaldo Azevedo

11/12/2018 03h36

1: Na condição de Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, dirijo a todos, e em especial aos eminentes Presidente e Vice Presidente eleitos, minha cordial saudação! É uma grande honra recebê-los neste Tribunal, que é, por excelência, o Tribunal da Democracia, Casa de todos os brasileiros!

2: Mais do que simples solenidade, esta é uma cerimônia em que se celebra a vitória do princípio democrático, cuja essência reside na consagração da vontade popular majoritária, a conferir aos vencedores das eleições de 2018 a unção da legitimidade política que os qualifica a serem diplomados, por este Tribunal Superior Eleitoral, como Presidente e Vice-Presidente da República Federativa do Brasil!

Este, portanto, é um momento de particular significação histórica, pois a diplomação dos candidatos vencedores em eleições livres traduz um gesto de reverência ao soberano pronunciamento do Povo e atesta a superioridade da ordem constitucional, cuja primazia incumbe à Justiça Eleitoral sempre fazer prevalecer no desempenho de sua missão!

Ao velar pela normalidade e regularidade do processo eleitoral neste ano de 2018, o Tribunal Superior Eleitoral, uma vez mais, garantiu a certeza e a legitimidade dos resultados das urnas, e assegurou, em fiel observância aos postulados maiores de nossa Constituição, o primado da vontade soberana de quem, o Povo, é a fonte real de todo poder no âmbito das sociedades fundadas em bases democráticas!

3: Os diplomas que este Tribunal Superior Eleitoral está a conferir, a par da beleza intrínseca que ostentam, confeccionados com esmero pela Casa da Moeda do Brasil, valem, sobretudo, pelo valor imaterial de que simbolicamente se revestem, enquanto retratam a vitória dos escolhidos nas urnas e constituem a expressão da vontade popular que nelas foi democraticamente manifestada, com absoluta segurança e total lisura.

4: Mais uma vez o Brasil, em regime de normalidade institucional, escolheu seus representantes por meio do sufrágio direto e igualitário, em eleições cuja periodicidade merece incondicional respeito para que rupturas com desprezo à ordem constitucional não interrompam o processo democrático.

5: E mais, Senhoras e Senhores, esta sessão realiza-se sob o signo de uma data de singular importância na história da luta permanente do Povo pela conquista e preservação de seus direitos básicos.

Refiro-me ao Dia Mundial dos Direitos Humanos, hoje celebrado! Há exatos 70 anos, precisamente em 10 de dezembro de 1948, a 3ª Assembleia Geral das Nações Unidas, reunida extraordinariamente em Paris, promulgou a Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, que o Brasil subscreveu, a proclamar, já em seu preâmbulo, que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.

Também neste ano de 2018 se comemoram os setenta anos da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada na IX Conferência Internacional Americana, em Bogotá, em abril de 1948, documento revestido de inexcedível relevo no contexto do sistema interamericano em que nos inserimos, a antecipar, de modo significativo, em oito meses, a consagração, em nível global, dos direitos humanos no âmbito das Nações Unidas. Nele proclamou-se que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, sem distinção de raça, língua, crença, origem nacional, orientação sexual, identidade de gênero ou qualquer outra condição, porque, nunca nos esqueçamos, os direitos fundamentais da pessoa humana, além de universais, são essencialmente inexauríveis.

Esses importantes estatutos das liberdades públicas reverberaram, em conjuntura histórica de tempos especialmente sombrios, a repulsa à degradação da condição humana, e às atrocidades que dela sempre decorrem, em respeito à necessidade de fazer prevalecer a ideia essencial de que cada indivíduo é detentor de igual dignidade e senhor de direitos e liberdades inalienáveis, entre os quais o direito à vida, o direito à liberdade, o direito à segurança em sua projeção global, e o direito a ter direitos.

É o que solenemente estampa o Artigo 1º da Declaração Universal das Nações Unidas: "Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade"1 , ecoando o que reconheceu, com primazia, a Declaração Americana de abril do mesmo ano de 1948.

Em país de tantas desigualdades, como o nosso, Senhoras e Senhores, refletir a sobre as declarações de direitos não constitui mero exercício teórico, mas necessidade inadiável que a todos se impõe, governantes ou governados. Daí o significado ímpar desta data, o Dia Mundial dos Direitos Humanos, e a ênfase que se deve atribuir ao que expressa também o Artigo II da Declaração das Nações Unidas: "Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição".

6: Nessa linha, enfatizo que a democracia não se resume a escolhas periódicas, por voto secreto e livre, de governantes. Democracia é, também, exercício constante de diálogo e de tolerância, de mútua compreensão das diferenças, de sopesamento pacífico de ideias distintas, até mesmo antagônicas, sem que a vontade da maioria, cuja legitimidade não se contesta, busque suprimir ou abafar a opinião dos grupos minoritários, muito menos tolher ou comprometer-lhes os direitos constitucionalmente assegurados.

Em uma democracia, Senhoras e Senhores, maioria e minoria, como protagonistas relevantes do processo decisório, hão de conviver sob a égide dos mecanismos constitucionais destinados à promoção do amplo debate, sem pré-compreensões estabelecidas, nos foros políticos e sociais adequados. Mais do que isso: a todos os cidadãos, sem qualquer exclusão, se assegura um núcleo essencial de direitos e garantias que não podem ser transgredidos nem ignorados, pelas instâncias de poder nem pelas instituições da sociedade civil, pelo simples fato de não refletirem em dado momento histórico a vontade dos grupos majoritários.

Vale insistir, Senhoras e Senhores, na asserção de que o princípio democrático, expressão vital de nossa crença inabalável na autoridade da Constituição da República, reside não só na observância incondicional da supremacia da ordem jurídica, mas também no respeito às minorias, em especial àquelas estigmatizadas pela situação de vulnerabilidade a que se acham injustamente expostas.

Em uma república democrática, a Constituição e as leis a todos irmanam, nivelam e igualam, com lapidarmente observou João Barbalho, eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal e integrante do Congresso Constituinte de 1890/1891.

Os sistemas de governo constituem, sem dúvida, modelos em permanente evolução. As reformas políticas, por isso mesmo, hão de ser implementadas sempre com o elevado propósito de aperfeiçoamento das instituições da República, jamais com o intento menor de inibir o dissenso ou excluir forças políticas com ideologia diversa.

A democracia, não nos esqueçamos, repele a noção autoritária do pensamento único. É da essência mesma do regime democrático a convivência de opostos, pois dessa pluralidade resulta a realização de um dos princípios estruturantes do Estado Democrático de Direito, como expressamente o proclama nossa Constituição (art. 1º, V).

7: A necessidade de conferir garantia à estabilidade desses direitos essenciais é, em país regido por uma Constituição democrática, como a nossa, uma das funções mais relevantes e irrenunciáveis do Poder Judiciário: o exercício da jurisdição das liberdades. Como diz o artigo VIII da Declaração Universal de 1948:

"Toda pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei".

Ao Poder Judiciário compete, por imposição institucional, a garantia da higidez do jogo democrático por meio da proteção de todos os seus partícipes – candidatos, agremiações partidárias e cidadãos-, a partir do reconhecimento da eficácia das salvaguardas constitucionais que englobam, para efeito de sua proteção, os direitos humanos e fundamentais contra quaisquer formas de opressão, intolerância, exclusão e discriminação.

8: A luta pela efetivação e "prevalência dos direitos humanos", como determina a própria Carta Política (art. 4º, II), não deve, porém, ter como palco apenas os tribunais, não obstante sejam estes espaços institucionalizados essenciais ao processo de reconhecimento, afirmação, defesa e consolidação das liberdades fundamentais.

Esse esforço há de ser compartilhado por todos, de modo a viabilizar avanços civilizatórios à sociedade brasileira. Tenha-se presente, aqui, no contexto que venho de referir – hoje particularmente agravado pela situação dramática dos refugiados e das pessoas deslocadas ("displaced persons"), vítimas infelizes de terrível crise humanitária -, que o Brasil está vinculado política e juridicamente, nesse plano, a compromissos generosamente assumidos há décadas no plano internacional, em respeito aos tratados e convenções firmados no âmbito do Direito das Gentes.

9: Inquestionável é que o Estado brasileiro se encontra comprometido com a efetivação dos direitos humanos. Isso resulta claro não só dos deveres assumidos perante a comunidade internacional, mas sobretudo pelo que a própria Constituição, que vem de completar trinta anos, determina.

10: Por isso, de inegável relevo, Senhor Presidente eleito, o compromisso de V. Exa., reafirmado nesta Casa quando aqui esteve em visita, de que o respeito incondicional pela supremacia da Constituição será o Norte do seu governo, pois, em suas próprias palavras, a Constituição é o "Norte da Democracia".

Recebam mais uma vez, eminente Presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro, e eminente Vice Presidente eleito, Antonio Hamilton Martins Mourão, os meus cumprimentos!

Desejo-lhes êxito e felicidade!

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.