Topo

Reinaldo Azevedo

Na ausência da coordenação política, Rodrigo Maia se torna o real interlocutor do governo no Congresso em favor da Reforma da Previdência

Reinaldo Azevedo

07/02/2019 08h34

A Bolsa levou um tombo feio ontem. Houve fatores externos, a Vale etc. Mas o mau humor que mais chamou a atenção foi mesmo com a reforma da Previdência. Há algum tempo — Meses? Anos? —, venho chamando a atenção para o fato de que essa turma faz de conta que a política não existe. Tanto mais nestes dias: essa gente se encantou com Jair Bolsonaro porque passou a acreditar na eficiência do murro na mesa — o estilo "prendo e arrebento" — e nas virtudes demiúrgicas de Paulo Guedes, ministro da Economia. E, então, "comprou" o candidato Bolsonaro. "Ah, este faz a reforma!" Não digo que não fará. Mas é tolice ou esperteza de especuladores esse negócio de que o governo enfiará goela abaixo do Congresso aquilo que lhe der na telha. Quanto vale a aposentadoria aos 65 anos para ambos os sexos? Não sei. Mas quem está comprado nessa ideia pode vender os papéis.

E o fim de todos os privilégios? Quanto está valendo? Também pode vender enquanto rende alguma coisa. Parte considerável da bancada do PSL é formada de policiais. Lutarão por aposentadorias diferenciadas. Acontece que cada grupo tem lá as suas especificidades, não é mesmo? Discurso liberal não costuma render muitos votos. E também não é a praia frequentada pelos Bolsonaros. Steve Bannon, o líder da extrema-direita populista americana, gosta é de protecionismo e de Estado assistencialista se for essa a vontade do povo. Elegeu Eduardo o seu homem na América Latina. Destrata o general Hamilton Mourão, o mais liberal entre os generais, e chama, em tom de desdém, Paulo Guedes de "O homem de Chicago".

Mas Eduardo Bolsonaro manda alguma coisa? Estou evidenciando que falta clareza a essa turma. Não por acaso, o filho deputado do presidente, o mais votado do país, chegou a afirmar que o pacote de segurança de Sérgio Moro — um pequeno show de horrores jurídicos, irrelevante no combate à violência — serviria de bom teste para a reforma da Previdência. Como? Ora, seria uma estupidez votá-lo antes da reforma. Até porque vai esbarrar no Supremo. Precisou que Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, viesse a público para lembrar qual é a prioridade.

Maia, diga-se, tornou-se o efetivo coordenador político do governo. Reparem que, depois da desordem patrocinada no Senado, o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) desapareceu. Notoriamente avesso à minuta que vazou, caberia a ele ao menos atuar para diminuir o desgaste. Mas sumido continuou. Na Câmara, os peesselistas estão muito ocupados na notável empreitada de xingar Lula e de aplaudir a sua segunda condenação, ignorando, como resta óbvio, as coisas mal explicadas em seu próprio quintal. 

O presidente da Câmara é, sim, um defensor das reformas, mas é claro que tem as suas próprias atribuições, e seu papel de coordenador político do governo tem lá as suas limitações. Entre outras coisas, não poderá recorrer à trapaça política para fazer a reforma avançar, como se supunha por aí: "Por que não pegar a proposta do Michel Temer e apensar as novidades?" Porque o texto de agora é outro, muito mais severo. Seria legal? Seria. É conveniente que se faça? Não! Ademais, vamos convir: para parte considerável do eleitorado de Bolsonaro, a reforma não era pauta. Uns queriam "moral & bons costumes", sem beijo na boca de homem com homem, mulher com mulher. Outro tanto esperava que ele pegasse bandidos pelo colarinho. Em nenhum momento o capitão disse: "Olhem aqui, todos terão de trabalhar mais para se aposentar". Na agenda populista de Steve Bannon, que tem nos Bolsonaros os seus nativos locais, isso nem estaria em questão. Afinal, é coisa do "homem de Chicago", a ser ignorada.

O que deixou o mercado de farol baixo não foi o conteúdo da reforma pretendida por Paulo Guedes. Se tivesse sido um sucesso de crítica e de público, a Bolsa estaria passando os 100 mil pontos. O que levou a turma a ficar assustada foi a reação negativa na própria base de Bolsonaro: "Ah, essa reforma não!" Mas então qual? Vamos ver. Populistas não gostam de desagradar às massas. Ademais, o texto que sair do Planalto será necessariamente desvitaminado no Congresso. Porque a política existe. Os mercados votam. Mas não são votados. E eles sempre têm dificuldade de entender esse troço. De resto, existem hoje as redes sociais. O país que se dane. Os parlamentares da nova política só não podem ficar sem likes. E sem xingar Lula, claro"! Ou farão e dirão o quê?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.