Bolsonaro é hoje o chefe de oposição ao governo Bolsonaro. E alerta que fiz aqui há quase três meses ao pai e seus filhos
A coisa tem lá a sua graça trágica. No dia 29 de novembro do ano passado, escrevi quatro posts cujos títulos traziam a palavra "ABSURDO" em caixa alta. São interligados. Lendo o primeiro, você é remetido ao demais. O "'ABSURDO 4" traz o seguinte título: "Cumpre que Bolsonaro e seus filhos tomem cuidado: movimentos disruptivos acabam engolindo os próprios entusiastas. É um clássico!". E afirmei no texto:
"É preciso que Bolsonaro e seus filhos tomem cuidado. Os movimentos disruptivos — e a eleição do capitão foi um deles — costumam engolir seus próprios aliados. E isso acontece à direita e à esquerda. Alguém com a importância que tem Carlos na trajetória política recente do presidente eleito não deveria fazer especulações dessa natureza nem contra adversários e inimigos. Tanto pior quando se refere a aliados. Fica parecendo que Bolsonaro está num ninho de cobras mesmo quando entre os seus. Se é assim antes de chegar ao poder, como pode ser depois?
E por que escrevi há quase três meses o que vocês acabam de ler? Carlos, o pivô da queda de Gustavo Bebianno publicou o seguinte em seu perfil no Twitter:
"A morte de Jair Bolsonaro não interessa somente aos inimigos declarados, mas também aos que estão muito perto. Principalmente após sua posse! É fácil mapear uma pessoa transparente e voluntariosa. Sempre fiz minha parte exaustivamente. Pensem e entendam todo o enredo diário!"
O recado, obviamente, era diretamente endereçado a ninguém menos do que o general Hamilton Mourão, o vice-presidente. O bolsonarismo só existe como guerra permanente contra todos aqueles que não comunguem rigorosamente da mesma cartilha que une pai e filhos. E quem lhe dá um suposto suporte teórico e confere alguma unidade de pensamento é ninguém menos do que Olavo de Carvalho, o autointitulado filósofo que, por seu turno, abriu guerra contra a democracia ocidental porque estaria corroída pela conspiração comunista-globalista.
Nesse ambiente de paranoia, não existem aliados, mas subordinados; não existe interlocução, mas sujeição.
É claro que o episódio Bebianno não acabou. Por si, não tira votos da reforma da Previdência. Mas também não ajuda a dar votos. Os desdobramentos, no entanto, de uma eventual guerra interna podem, sim, causar muita dor de cabeça ao governo. Um governo em que o presidente é o chefe da oposição.