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Reinaldo Azevedo

O COMPLEXO DE VIRA-LATA DA DIREITA 3: Mito, muro e ação bélica na Venezuela

Reinaldo Azevedo

19/03/2019 07h05

Bolsonaro concede entrevista para Shannon Bream, apresentadora da Fox News (Foto: Terceiro / Alan Santos)

"Temos alguns assuntos que estamos trabalhando em conjunto, reconhecendo obviamente a capacidade econômica, bélica, entre outros, dos Estados Unidos. Temos que resolver a questão da nossa Venezuela. A Venezuela não pode continuar do jeito que se encontra. Aquele povo tem que ser libertado. E contamos com apoio norte-americano para que esse objetivo seja alcançado. Juntos podemos fazer muito."

A infelicíssima fala acima, que serve para excitar a imaginação da extrema-direita, é um desastre. Em primeiro lugar, com efeito, a Venezuela é "nossa", mas os únicos com autoridade para dizê-lo são os venezuelanos. Em segundo lugar, como presidente do maior país da América Latina, daquela nação que deveria se comportar como potência regional, a fala é de uma subserviência constrangedora. Bolsonaro não pode pedir uma guerra na sua área de influência, terceirizando, no entanto, a tarefa de jogar as bombas ou de dar os tiros. Em terceiro lugar, se o Brasil, oficialmente, se diz contrário a uma intervenção armada no país vizinho — e o porta-voz, Rego Barros, reiterou esse ponto de vista —, como é que Bolsonaro fala em "capacidade bélica"?

É uma soma de despropósitos.

O presidente concedeu depois uma entrevista à Fox News e defendeu o muro separando o México dos EUA. E o fez nestes termos:
"A grande maioria dos imigrantes em potencial não tem boas intenções nem quer o melhor ou fazer bem ao povo americano. Eu gostaria muito que os EUA levassem adiante a atual política de imigração, porque, em larga medida, nós devemos a nossa democracia no Hemisfério Sul aos Estados Unidos."

Não por acaso, Eduardo Bolsonaro, seu filho, diz se envergonhar dos imigrantes brasileiros que estão ilegalmente nos EUA. Bolsonaro deve achar que um bando de gente mal-intencionada.

É evidente que ele não sabe direito do que está falando e que está juntando fragmentos de coisas aprendidas meio de orelhada. Comparou ainda o país à casa das pessoas, indagando se elas aceitariam que as portas fossem retiradas.

Não vai ser fácil.

Claramente, a reforma da Previdência de Paulo Guedes é só uma agenda modernizadora — para os liberais ao menos; os esquerdistas discordam — que se juntou ao reacionarismo primitivo representado por Bolsonaro. Exceção feita aos fanáticos, poucos discordam quanto a esse particular.

Quando as duas coisas se juntam, aqui em território brasileiro, o resultado está longe de ser eficaz.

Confesso, leitor: a primeira vez que li o que Bolsonaro falou sobre os imigrantes, meu cérebro corrigiu a seu favor a asneira. Entendi que ele havia dito: "A grande maioria dos imigrantes em potencial TEM boas intenções". Mas não! Isso era só a voz da minha esperança de que as coisas possam não ser, assim, tão desastrosas.

Mas são.

Afinal, era Bolsonaro falando.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.