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Reinaldo Azevedo

“Estilo testicular” de Bolsonaro (by Guedes) ainda não chegou à Previdência

Reinaldo Azevedo

20/03/2019 05h58

Rodrigo Maia, presidente da Câmara: ele está se esforçando para fazer a reforma. Mas cadê o governo?

O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, decidiu, desde que se sagrou presidente da Casa pela terceira vez consecutiva, ser, vamos dizer assim, um dos apóstolos da reforma da Previdência. Sabe, obviamente, o peso que isso tem. Inexiste mudança nessa área que seja popular. Convencer os deputados não é tarefa muito fácil. Para tanto, seria necessário que o próprio presidente da República estivesse efetivamente engajado na mudança e que seus articuladores no Congresso trabalhassem em favor do texto.

Mas onde eles estão?

Já escrevi neste blog algumas vezes: ocorre que o próprio Bolsonaro, lá no fundo do coração, não chega a ser um entusiasta do texto, e o governo é, efetivamente, uma bagunça. O chefe do Executivo gasta mais tempo debatendo tolices como combate ao socialismo, ideologia de gênero e viés ideológico dos fantasmas que habitam a sua cabeça do que defendendo a reforma.

Cadê Onyx Lorenzoni, o chefe da Casa Civil, que deveria ser o principal articulador no Congresso? Exceção feita ao líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), as lideranças escolhidas pelo Planalto ou pelo PSL são de uma inexperiência constrangedora. O presidente da Câmara começa a perceber que, tudo o mais constante, a reforma da Previdência acaba se confundindo com uma empreitada pessoal, sua. E, definitivamente, não é.

Há dias, depois de se encontrar com Maia, que falou sobre a necessidade de estruturar a relação com parlamentares — que passa, sim, por preenchimento de cargos, o que não é sinônimo de corrupção —, Bolsonaro saiu anunciando que enfrentava "pressões da velha política". Tá bom! Que apele, então, à nova política para aprovar o texto, ora bolas!

Por enquanto, tem funcionado uma espécie de pensamento mágico em áreas do governo, que contamina também os tais "mercados". Como há números que indicam que a reforma da Previdência é necessária, então se considera que ela será aprovada. Tudo num estalar de dedos. E sem que o próprio presidente precise se comprometer com o texto para valer.

Nos EUA, ao falar a investidores, Guedes exaltou as "balls" do presidente — os tais "colhões" —, elogiando a sua coragem de enviar ao Congresso o texto da reforma. Ocorre que até eunucos, para continuar no estilo testicular inaugurado por esse governo, mandam textos para Congresso. A questão é se organizar para aprová-los e enfrentar as reações. E isso Bolsonaro ainda não fez. De algum modo, ele considera que é uma tarefa para o Congresso. É esperto o suficiente para perceber que a fama de "reformador da Previdência" pode lhe render amor eterno de financistas, mas estes, por si, não elegem nem reelegem ninguém.

E não é só temor da impopularidade que imobiliza o governo. É a desordem mesmo. Bolsonaro trata Maia, no caso da reforma, como se este fosse um primeiro-ministro. Não que fosse má ideia, dado o desgoverno que aí está. Mas, então, que lhe fosse dado também o poder, não é?

Aquela conversa mole tantas vezes criticada aqui de negociar com bancadas temáticas mostrou-se o que estava destinada a ser: uma tolice. Quem vota efetivamente com o governo no texto da Previdência? Só o PSL. E olhe lá. Vá perguntar aos eleitos que são oriundos da Polícia, a começar de Delegado Waldir (GO), líder do PSL na Câmara, se eles endossam, de olho em seu eleitorado, o texto como está.

Vamos ver se Bolsonaro põe alguma ordem na bagunça com seu retorno ao Brasil e se assume, de vez, a reforma da Previdência e passa a defendê-la. Há o risco de ele trocar o tema por, sei lá, a defesa de uma guerra com a Venezuela. Afinal, a dar crédito ao que disse nos EUA, ele foi eleito por vontade Deus, e sua principal missão é combater o comunismo, certo? Além, claro!, de impedir que meninos brinquem de boneca por culpa dos professores que adotam a ideologia de gênero.

Aí só restam os raciocínios apocalípticos de Guedes caso o texto não avance ou seja desfigurado, além da sutil ameaça de que, a ser assim, ele prefere brincar de outra coisa.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.