Linguistas e Juristas: Moro na Maria da Penha por espancar língua e direito
Este vídeo circula nas redes. Vejam ou revejam. Volto em seguida.
O marketing da Lava Jato, com a colaboração de alguns adoradores de mitos da imprensa, que continuam mais passivos do que nunca, construiu a imagem de um Sérgio Moro, vamos dizer, verdadeiramente inoxidável, sabido, culto, que esmaga qualquer um no debate, implacável, senhor do direito, um verdadeiro craque do "Cirque du Soleil" em matéria de leis. Nota: no direito, o ex-juiz, vamos convir, estaria mais para um membro do Harlem Globetrotters se suas manobras com a legislação, embora, claro!, ilegais, fossem mais elegantes…
E, no entanto, quando deixado a nu, sem o aparato truculento que se desenvolveu à sua volta sob o pretexto de combater a corrupção — com o auxílio luxuoso de heterodoxos de punhos de renda, como Roberto Barroso —, o que se vê é o, vamos dizer, jurista na sua crueza: no vocabulário, nos dons do pensamento, na gramática…
Sim, eu já havia alertado para a ruindade da sua língua. As sentenças em que condena Lula — tanto a do apartamento como a do sítio, esta última assinada pela juíza Gabriela Hardt, aquela que homologou a fundação bilionária com grana da Petrobras — deveriam enquadrá-lo na Lei Maria da Penha para Espancamento da Inculta & Bela.
No vídeo lá do alto, no entanto, que circula por aí, ele abusou do direito de ser truculento com a Última Flor do Lácio. O homem defendia na Câmara o seu "pacote contra o crime", que traz mudanças no Código Penal que dão licença para matar. A língua apanha muito. Mas acreditem: o direito apanha ainda mais.
Como dá para perceber, "cônjuge" vira "conge". Não uma, mas duas vezes. E não é um problema de prosódia, que leva os falantes a comer sílabas, como o "mineirin", que larga a palavra pelo meio e parte para a próxima. Ou o paulista, "meu, que come os esse". Não! Paranaenses, diga-se, costumam escandir as palavras em sílabas bem marcadas, né?
Ó grande Cesare Beccaria do "Teje preso!", esclareça-nos: escreve-se "conge", "côngi", "conje" ou "cônji"?
O ministro também emprega "vim" — primeira pessoa do pretérito perfeito do verbo "vir" — em lugar do infinitivo desse mesmo verbo, um erro muito comum, decorrente da pouca leitura. Na sua fala, "a mulher pode VIM a ser"…
E, ora vejam!, repete o mesmo erro cometido por Iolene Lima, ex-secretária de Educação Básica do bolsonarismo: emprega "sobre" em vez de sob. Na sua formulação, alguém comete excessos "sobre forte emoção".
PARA ALÉM DA GRAMÁTICA
Mas há algo na sua fala ainda mais grave do que os erros de gramática. É o erro de direito. Ele quer que o Artigo 23 do Código Penal passe a figurar com o seguinte Parágrafo 2º:
"§ 2º O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção."
É uma das duas licenças para a barbárie que ele pretende introduzir no Código Penal. A outra está no Artigo 25, que permitiria até a morte como ação preventiva das forças de segurança: por exemplo, já chegar matando porque se pode alegar o risco de que o outro pode atirar primeiro. Mas voltemos ao 23.
Ora, excesso é excesso, certo? Não se questiona o direito à legitima defesa, já reconhecido pela lei. Mas Moro pretende dar à sua proposta notavelmente reacionária e brutalista o sotaque de algo progressista, quem sabe para ter apoio das feministas: e se sai, então, com o exemplo da mulher que cometeria excessos ao matar o marido. Qual excesso, doutor? Ela se defendeu e acabou matando o agressor ou, depois disso, resolveu cozinhá-lo em pedacinhos em água fervente e alimentar os cachorros? Tudo isso "SOBRE FORTE EMOÇÃO"?
É claro que que ele não redigiu a mudança pretendida no Artigo 23 para proteger as mulheres.
A língua de Moro é um atentado ao patrimônio da "Última Flor do Lácio".
A sua concepção de direito é um atentado ao patrimônio da humanidade.