Topo

Reinaldo Azevedo

Não vacinar criança e mentir sobre vacinas têm de ser crime tipificado

Reinaldo Azevedo

04/06/2019 17h03

Sim, é muito provável que a queda absurda de vacinação das crianças contra as mais variadas doenças esteja ligada, TAMBÉM, E APENAS TAMBÉM  , ao fato de que a erradicação de algumas doenças — MAS NÃO A ELIMINAÇÃO DO VÍRUS — leve os pais a cometer o erro de achar que seus filhos não correm mais risco. Assim, a eficiência do programa de vacinação abre a uma janela para a volta da doença. O mecanismo é conhecido dos especialistas em saúde pública. Mas há muito mais do que isso em curso. E tem a ver com a estupidez militante nas redes sociais.

Antes, alguns dados, segundo informa o Estadão:
Um levantamento do Ministério da Saúde sobre vacinação de crianças mostrou que, entre oito vacinas obrigatórias, apenas a BCG, dada após o nascimento e que protege contra a tuberculose, alcançou a meta de 95% de cobertura no ano passado.
(…)
Vacinação de crianças com menos de 2 anos está apresentando queda desde 2011, segundo Ministério da Saúde.

Embora seja a única que alcançou a meta, a BCG vem apresentando queda nos últimos oito anos. Em 2011, quando tem início a série do ministério, a cobertura era de 107,94%. No ano passado, atingiu 95,63%. Os dados de 2018 ainda são preliminares. Segundo a pasta, a vacinação de crianças com menos de 2 anos está apresentando queda desde 2011.

A vacina contra o rotavírus teve cobertura de 87,06% em 2011 e chegou a alcançar a meta de 95% em 2015, mas apresentou redução e, em 2018, ficou em 87,87%. A pneumocócica 10 valente passou de 81,61% para 91,51%. Em 2016, a meta foi atingida e o índice voltou a cair.  Em 2011, a vacina contra a poliomielite tinha cobertura de 101,33%. No ano passado, ficou em 86,33%. A queda da pentavalente foi de 98,97% para 85,26%. A tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola, também despencou – de 102,39% para 90,5%.

Mesmo imunizantes que foram introduzidos há menos tempo tiveram esse movimento de queda. Incluída em 2014 no Sistema Único de Saúde (SUS), a vacina contra a hepatite A teve cobertura de 60,13% em seu primeiro ano. Em 2015, chegou a 97,07%. No ano seguinte, caiu para 71,58% e não voltou a superar a meta em 2017 (83,05%) e 2018 (80,95%).

"A resistência à vacinação é uma preocupação para toda a sociedade, pois a difusão de informações equivocadas podem contribuir para a decisão de não vacinar. É importante destacar que o principal perigo em ter baixas coberturas vacinais é o risco de reintrodução de doenças já eliminadas no País. O fato de algumas doenças terem sido eliminadas ou terem baixa ocorrência no País, como a poliomielite, por exemplo, causou uma falsa sensação de que não há mais necessidade de se vacinar, porque a população mais jovem não conhece o risco", avalia o ministério.

Segundo a pasta, 19 imunizantes integram o Calendário Nacional de Vacinação, que oferece doses para diferentes faixas etárias, do recém-nascido ao idoso. " Há ainda vacinas especiais para grupos em condições clínicas específicas, como portadores de HIV/Aids, disponíveis nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE)."

Comento
Bolsoanro está em busca de uma causa? Eis aí uma que ele poderia abraçar. E não apenas como garoto-propaganda. Seu governo também tem o que fazer.

Em vez de Sérgio Moro investir no marketing pessoal, com seu projeto anticrime que dá licença para matar, deveria estar empenhado em combater os criminosos que espalham informações falsas na Internet contra as vacinas, inventado supostos efeitos colaterais que nunca existiram.

Pior: há idiotas às pencas que sustentam que as pessoas têm o direito de se opor à vacinação. Não tem, não! As pessoas têm o direito de se matar, mas não o de matar os outros — o que inclui os próprios filhos. E é disso que estamos falando.

Mas dizer o quê? Temos um governo que se deixa orientar por crendices, não é mesmo? Vejam o caso do projeto de Bolsonaro sobre a CNH. Que ciência o orienta? Como esquecer que o guru do nosso líder, o Bruxo da Virgínia, está neste momento avaliando a cientificidade da Terra plana?

A bitola da Web em que circulam as boçalidades ideológicas mais pavorosas é a mesma em que transitam as teorias conspiratórias sobre as vacinas.

O Brasil assistiu a uma "revolta da vacina" em 1904, quando se impôs a imunização obrigatória contra a varíola. Falou ali um misto de desinformação com um protesto que tinha raiz política. Há estudos a respeito. A vacinação obrigatória acabou sendo um estopim.

Aquelas circunstâncias não estão dadas hoje.

Os pais que não vacinarem seus filhos têm de ser responsabilizados na esfera penal mesmo. Tem de se crime tipificado, para além das obrigações impostas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

E é preciso responsabilizar, também na esfera criminal, os que espalham fake news sobre vacinas.

Não! Nesse caso, não se trata de direito à opinião. Trata-se apenas de crime.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.