Mortes por armas de fogo disparam. E a boçalidade do presidente do Ipea
Quando se trata de violência, os números revelam o que a realidade empírica já escancara: a esmagadora maioria dos homicídios é praticada por intermédio de arma de fogo. Informa o Globo:
O número de pessoas assassinadas com armas de fogo cresceu 6,8% no país entre 2016 e 2017, de acordo com dados do Atlas da Violência de 2019, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e divulgado nesta quarta-feira. No Rio, o crescimento foi ainda maior: 9,8%. O aumento das mortes por disparos acompanha a tendência do número total de homicídios. Em 2017, 65.602 mil pessoas foram mortas no Brasil — um crescimento de 4,2% em relação ao levantamento anterior — sendo que 47.510 mil (72,4%) foram mortas por tiros, atingindo um patamar inédito.
O que se sabe, diante da recuperação da série histórica de número de mortes por armas de fogo, é que quase um milhão de brasileiros perderam a vida vitimados por disparos entre 1980 e 2017. Para a equipe responsável pelo Atlas da Violência, o número seria ainda maior não fosse a aprovação do Estatuto do Desarmamento, em 2003.
De 14 anos para cá, desde a promulgação da lei do Estatuto do Desarmamento, a taxa média de crescimento anual de mortes por armas é de 0,85%, queda brusca em relação aos 14 anos anteriores à lei que era de 5,44%. Há a indicação de que o Estatuto quebrou uma tendência, e que poderia ter sido acompanhado por outros fatores de cunho macroeconômico e/ou demográfico.
Não obstante, este é o país em que o presidente da República assina, num intervalo de quatro meses, três decretos facilitando a posse o porte de armas. Inicialmente, a tese furada era a de que as armas diminuiriam a violência. O discurso se tornou insustentável. A cascata da hora é a tal do direito à autodefesa. Felizmente, a maioria da população continuará desarmada, mas as milícias e o narcotráfico estão muito gratos a Bolsonaro.
Mas o que pode a ciência contra o preconceito e a ideologia? Nada! Porque afirmo isso.
Informa também o Globo:
O economista Carlos Von Doellinger, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), teceu críticas a um dos principais pontos da quarta edição do estudo chamado de Atlas da Violência, uma parceria da fundação federal com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Ele disse aos jornalistas que estavam presentes na coletiva de lançamento da pesquisa nesta segunda-feira, no Rio, que gostaria de fazer um "reparo" num dos trechos que trata sobre as mortes por arma de fogo (há um capítulo inteiro do trabalho dedicado ao tema). O nome de Von Doellinger, que se disse a favor da posse e do porte de armas, foi sugerido pelo ministro da Economia Paulo Guedes ao presidente Jair Bolsonaro em novembro do ano passado — a nomeação dele aconteceu em março.
Ao discursar no início do evento, o presidente do Ipea destacou dados que pontuou como expressivos (como os do PIB gastos com segurança em 2016) , ressaltou que os dados são referentes ao ano de 2017 e não têm relação "com as prioridades do atual governo" e pediu licença aos pesquisadores responsáveis pelo Atlas da Violência para expressar a própria opinião sobre armas. Elas são um tema abordado expressivamente no estudo (são citadas mais de 40 vezes) e foram objeto de um dos dados mais explorados pelos autores: o crescimento do número de mortos por disparos, que teve uma alta de 6,8 em 2017 .
"Faço apenas um reparo, um apontamento sobre o estudo trata a relação sobre o número de armas em circulação e o aumento da criminalidade. Como cidadão, me incomoda a impossibilidade do cidadão de bem, sem antecedentes, ter uma forma de defender a integridade física, de sua propriedade e da sua família. Acho que esse é um direito do cidadão", disse Von Doellinger.
Ao continuar a fala, o presidente do Ipea relatou uma experiência vivida em Angola onde, segundo ele, os números de homicídios se mantiveram baixos mesmo diante da população armada. Os culpados por levar a criminalidade para o país africano teriam sido traficantes brasileiros.
"A taxa de homicídio era baixíssima no país quando todos andavam armados. Anos depois, começou a aparecer a criminalidade. Os ministros me disseram que os brasileiros trouxeram um negócio de drogas e o povo começou a consumir. E a criminalidade começou a surgir, era praticamente desconhecida. O governo de lá resolveu adotar normas rigorosas de repressão ao tráfico e a polícia não tem muito esse negócio de direitos humanos. Conseguiram reprimir as taxas de criminalidade e elas caíram novamente", relatou Von Doellinger, sem mencionar dados estatísticos ou informações numéricas sobre o assunto.
Comento
Temos um presidente do Ipea que contesta uma pesquisa técnica com suas impressões genéricas e se dados sobre o que teria ocorrido em Angola. Nota-se também que o doutor acha que "esse negócio de direitos humanos" pode atrapalhar o combate à criminalidade e à violência.
Só para registro: Angola é uma ditadura, originalmente comunista.
Eis aí. Von Doellinger é considerado um moderado do bolsonarismo.
Vamos ver o que restará de país ao fim dessa jornada.