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Reinaldo Azevedo

AJD emite nota de repúdio à fala de Moro sobre o papel de um juiz

Reinaldo Azevedo

19/06/2019 22h28

A Associação Juízes para a Democracia — da qual, já escrevi aqui, discordei muitas vezes — emitiu uma nota impecável sobre o depoimento do ministro Sérgio Moro à Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

Moro insistiu na tese de que nada há de impróprio em suas conversas com o procurador Deltan Dallagnol. Há, sim! Violam o Inciso IV do Artigo 254 do Código de Processo Penal. Violam os Artigo 2º, 8º, 9º e 10º do Código de Ética da Magistratura.

Sobre a relação entre o juiz e o Ministério Público, escreve a AJD: "É inaceitável que o Ministro confunda a urbanidade na interação entre juízes e membros do Ministério Público, com a fusão de seus distintos papéis processuais, bem delineados em nossa Constituição".

Segue a íntegra:
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A AJD — Associação Juízes para a Democracia (AJD) — entidade não governamental, de âmbito nacional, sem fins corporativos, que tem como um de seus objetivos estatutários a defesa dos direitos e garantias fundamentais e a manutenção do Estado Democrático de Direito, vem a público externar seu mais veemente repúdio às declarações do Ministro da Justiça e Segurança Pública, que, em repetidos pronunciamentos públicos, tem classificado como "absolutamente normal" e "muito comum" o contato privado de juízes com procuradores para tratar de questões e estratégias processuais em feitos sob sua responsabilidade, ampliando-se para atuações fora do próprio âmbito do processo, conforme se verifica no conteúdo das mensagens recentemente divulgadas pelo site The Intercept Brasil (https://theintercept.com/2019/06/18/lava-jato-fingiu-investigar-fhc-apenas-para-criar-percepcao-publica-de-imparcialidade-mas-moro-repreendeu-melindra-alguem-cujo-apoio-e-importante/).

Tais práticas não refletem, em absoluto, a conduta das magistradas e dos magistrados brasileiros que cumprem o seu dever funcional. Ao defendê-las, o Ministro promove uma inaceitável banalização do exercício distorcido da atividade judicante, ofensiva à sua dignidade, seriedade e respeitabilidade, que é também incompatível com a dignidade, a honra, o decoro e a transparência exigidos pelo Código de Ética da Magistratura, cujo artigo 8º é claro ao estabelecer que "o magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo. ao longo de todo o processo, uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito".

É inaceitável que o Ministro confunda a urbanidade na interação entre juízes e membros do Ministério Público, com a fusão de seus distintos papéis processuais, bem delineados em nossa Constituição.

É ainda mais deplorável que o ministro tenha a pretensão de subordinar a perene dignidade institucional da Magistratura ao sabor de estratégias ligadas a meros interesses individuais conjunturais.

Não aceitaremos, pois, que, para justificar sua conduta inapropriada, o ministro tente imputar a toda a magistratura nacional a prática das mesmas ilicitudes.

Brasil, 19 de junho de 2019.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.