O que tem de ser dito sobre a conversa Moro-Faustão. Quem ensina o quê?
Sergio Moro praticou uma penca de violações ao devido processo legal. E, sobre isso, não há a menor dúvida. Quero me ater aqui um pouquinho à conversa com Faustão, que tem gerado barulho nas redes sociais.
Vamos lá. É conhecida a tendência que têm no Brasil os artistas e as celebridades de se posicionar sobre qualquer assunto. Se houver uma pendenga sobre física quântica, fiquem certos, os medalhões — e, hoje em dia, também os das redes sociais — darão a sua oportuna e iluminada opinião.
No caso, Faustão deu uma dica numa conversa privada. E, há de se supor, um dos maiores comunicadores do país tem o que ensinar a qualquer um sobre como se comunicar com as massas.
O contrário é que é certamente impossível. Sergio Moro não tem dica nenhuma a dar a Faustão sobre o devido processo legal e o estado de direito, matérias em que o apresentador não é especialista.
Imagino que Faustão tivesse, então, um juízo favorável à Lava Jato e que visse no juiz, com efeito, o cruzado contra a corrupção. Vamos convir: na média, a imprensa certamente não aderiu a essa fantasia redentora menos do que o apresentador. Com a diferença de que ele não tem a obrigação da precisão. Se o jornalismo da Globo for isento, seus artistas podem pensar as coisas mais exóticas. O que não pode é o contrário.
Sim, Faustão pode pedir que os procuradores sejam mais claros, não é?, mas nem os procuradores nem Moro têm como ensinar ao apresentador o que dispõe o Inciso IV do Artigo 254 do Código de Processo Pena, a saber:
"Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes (…) se tiver aconselhado qualquer das partes".
Se, no próximo domingo, Faustão se insurgir contra a lei, então levará a devida pancada deste "blogueiro" — que é como Dallagnol gosta de me chamar na suposição de que me ofende. Blogueiro, sim! Chicaneiro e pistoleiro, nunca!
Se, no próximo domingo, Faustão falar que o Artigo 8º do Código de Ética da Magistratura é lixo a ser descartado, então farei a mesma coisa. Lembro a ele:
"Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito."
Se, no próximo domingo, Faustão sugerir qualquer coisa como: "Esse negócio de lei é só diversionismo de quem quer tirar corruptos da cadeia, pondo fim ao trabalho da Lava Jato", só então terei de lhe perguntar se mantém um contrato com a Globo; se o merchandising que faz em seus programas é regido por obrigações a serem cumpridas pelas partes. Como a resposta, obviamente, seria "sim", aí eu teria de indagar por que ele acha que o direito penal pode jogar no lixo a sociedade do contrato. Ou ainda: por que a sociedade do contrato para ele, mas não para os outros.
Mas Faustão não fez nada disso — e não creio que o faça. Aposto que é favorável, como qualquer pessoa de bem, ao combate à corrupção, mas que pretende que ele se dê dentro da lei.
Faustão certamente tinha o que ensinar a Moro e procuradores sobre comunicação. Moro e procuradores é que não têm nada a ensinar a Faustão sobre direito.