Barroso confirma diálogos. Mais: democracia, justiça e corrupção de valores
O ministro Roberto Barroso, do Supremo, é mais um a confirmar o que todo mundo sabe, inclusive os protagonistas de diálogos impertinentes — além de eivados de ilegalidades: as conversas reveladas pelo site "The Intercept Brasil", em parceria com outros veículos, são verdadeiras. Essa é a notícia.
Leio o seguinte na coluna de Mônica Bergamo:
RODA GIGANTE
O jantar que o ministro Luís Roberto Barroso ofereceu em Brasília, em 2016, e que teve Sergio Moro e Deltan Dallagnol entre os convidados, não teve nada de secreto —outras 23 pessoas compareceram ao evento.
BEM-VINDA
O jantar não era para eles, e sim para a professora Susan Ackerman, da Universidade Yale, que visitava Brasília para um seminário no UniCeub sobre corrupção.
NA RODA
"Fiz uma pequena recepção em torno dela em minha casa, para a qual foram convidados alguns professores e expositores do seminário", diz Barroso. Entre eles estavam Moro e Dallagnol.
SEM ALARDE
Na semana passada, diálogos do arquivo obtido pelo site The Intercept Brasil mostravam Barroso pedindo "máxima discrição" aos dois ao convidá-los para o jantar.
SEM ALARDE 2
"Era apenas algo privado e reservado aos participantes do seminário", afirma Barroso. "Ninguém lá falou de Operação Lava Jato."
LUZ
Com a repercussão da publicação dos diálogos, o ministro decidiu esclarecer o assunto, publicando um texto também em seu blog.
RETOMO
A única coisa que Barroso esclareceu, de verdade, é que o jantar aconteceu, conforme revelou este escriba. A versão de que se tratava de uma homenagem à professora Susan Ackerman aparece agora, uma semana depois de divulgados os diálogos que se referem ao evento.
Barroso começa a adquirir o vício de seus parceiros de folguedos entre "acepipes", para empregar, com o sentido de dicionário, uma palavra ao gosto do ministro Abraham Weintraub. E que vício é esse? Negar o que ninguém afirmou — coisa que virou uma rotina nas manifestações públicas de Sergio Moro e Deltan Dallagnol.
O post em que informo a ocorrência do coquetel está aqui. Notem que, em nenhum momento, classifico o evento de "secreto". De qualquer modo, o argumento do doutor para evidenciar que secreto não era é ridículo: além de Dallagnol e Moro, havia outras 23 pessoas. E daí? Isso tornaria a coisa, por si, não-secreta? De toda sorte, essa afirmação não está no post original e não tem a menor importância.
Quanto ao motivo do encontro, cada um dê as justificativas que quiser a posteriori, para tentar se livrar do incômodo. Há a versão e há os fatos. Relembro o convite enviado por Barroso a Dallagnol, que o repassou a Moro:
"Caros Deltan, Moro, Oscar, Caio Mário e Susan: Tereza e eu teremos o imenso prazer em recebê-los para um pequeno coquetel/jantar em nossa casa, no dia 9 de agosto próximo, 3ª feira, às 20:30, em honra dos participantes do evento ",Democracia, Corrupção e Justiça: Diálogos para um País Melhor". Será uma reunião em traje casual, com a presença limitada aos organizadores do evento, o que inclui membros da minha assessoria e poucos dirigentes do UniCEUB. Com máxima discrição. Na medida do possível, desejamos manter como um evento reservado e privado. Estamos muito felizes de tê-los aqui. Nosso endereço é [TRECHO OMITIDO POR ESTE ESCRIBA]. Nosso telefone é [TRECHO OMITIDO]. Deltan tem meu telefone e pode ligar em qualquer necessidade. Abraços a todos. Luís Roberto Barroso."
RETOMO
Vai ver as pessoas só foram informadas de que se tratava de uma homenagem à professora Susan Ackerman quando chegaram à casa do ministro, não é mesmo? "Surpresa!" E todos cantaram: "A Susan é boa companheira, a Susan é boa companheiraaaaaa…."
Como se vê, não há nenhuma referência a respeito. Susan está listada apenas como uma das pessoas que gozarão da honra de experimentar os acepipes de Barroso.
O BLOGUEIRÃO
Eu sou, segundo Dallagnol, "jurista", com aspas, e blogueiro também. Sem aspas. Nas duas coisas, empato com Barroso, que tem uma página na Internet com uma aba destinada a seu blog. Depois do fenômeno das blogueirinhas da autoajuda, agora há o do "blogueirão da toga", para bem mais de 25 talheres…
Além das notas na coluna de Bergamo, Barroso escreve um post em seu blogão:
"Em 9 de agosto de 2016, a Professora Susan Ackerman esteve no Brasil, a convite de uma instituição acadêmica de São Paulo, para ministrar um seminário, em conjunto com outros expositores. Susan é esposa de Bruce Ackerman, que foi meu professor em Yale e é meu amigo há 30 anos. Convidei-a a dar o mesmo seminário em Brasília, intitulado "Democracia, corrupção e justiça: diálogos para um país melhor". Na véspera do evento, fiz um coquetel em minha casa em torno dela, para o qual foram convidados todos os participantes do seminário e alguns professores, num total de cerca de 25 pessoas.
O evento foi divulgado aqui em post de 10 de agosto de 2016: Democracia, corrupção e justiça."
O post evidencia que o ministro é muito bem-relacionado, que é uma pessoa influente e que é também capaz de empregar as palavras em sentido muito particular. Na coluna de Mônica, o jantar "era para a professora"; no seu post, tratava-se de um coquetel "em torno dela".
Um coquetel "em torno de alguém" deve ser aquele inferno em que o pobre homenageado não consegue respirar direito porque há sempre pessoas ao redor, como na música "Como vai você", de Roberto: "Eu quero amanhecer ao seu redor…"
Ah, sim, reiterando: no seminário intitulado "Democracia, corrupção e justiça: diálogos para um país melhor", em que Dallagnol abusou de seu bom humor supostamente juvenil, havia o "juiz de acusação" da primeira instância (Moro), o acusador (Dallagnol) e o "juiz de acusação" da terceira instância: o próprio Barroso. Falha grave: esqueceram de convidar o "juiz de acusação" da segunda instância: João Pedro Gebran Neto.
Só não havia um representante da defesa.
Dava para saber onde estavam a "corrupção" — no caso, a de valores. Só não é possível encontrar a democracia e a justiça.
De todo modo, que fique claro: Barroso é mais um a asseverar o que é óbvio: a autenticidade dos diálogos.