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Reinaldo Azevedo

El País e The Intercept Brasil revelam uma organização criminosa

Reinaldo Azevedo

06/08/2019 17h13

Faltassem outras evidências, agora a coisa está escancarada.

A Lava Jato, em especial a facção instalada em Curitiba e que constitui o coração da operação, está estruturada como uma organização criminosa para incriminar autoridades que passam a ser consideradas adversárias. Que fique claro: os procuradores sob o comando de Deltan Dallagnol — muito especialmente ele próprio — não estão interessados em encaminhar, pelos órgãos competentes, a investigação de eventuais indícios de crimes cometidos por esse ou aquele. Assim se faz nas democracias. Não! Os alvos são pré-definidos e se opera, então, uma espécie de devassa em busca de elementos que possam incriminá-los. É coisa típica de Estado policial.

O Parágrafo Primeiro da Lei 12.850 define o que é uma organização criminosa:
"§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional."

Sim, o que se fez em Curitiba contra o ministro Gilmar Mendes, do Supremo, se encaixa na definição.

Diálogos publicados pelo jornal El País, em parceria com o site The Intecept Brasil, indicam que, sob o comando de Dallagnol, a Lava Jata de Curitiba mobilizou autoridades da Suíça para investigar Mendes — que os bravos procuradores têm como um adversário da Lava Jato. E o que eles tinham de efetivo contra o ministro? Nada!

Deltan aparece num dos grupos do Telegram com a fofoca de que parte do dinheiro que Paulo Vieira de Souza, conhecido por Paulo Preto, mantinha na Suíça pertenceria a Gilmar Mendes. Algum indício, alguma evidência, algum sinal? Nada! Ele atribui o que chama de "info" à Lava Jato de São Paulo. A assessoria do braço paulista da operação afirma que nunca se tratou do assunto por ali.

O coordenador da Lava Jato monta, então, uma operação — com a evidência de autoridades suíças foram mobilizadas — para ver se encontravam alguma coisa contra Mendes. O objetivo era encontrar um "cartão" em nome do ministro para movimentar dinheiro que estivesse em alguma conta de Souza.

É espantoso. Ainda que a investigação esbarrasse em alguma suspeita de irregularidade relacionada ao ministro, o que não aconteceu, o caso teria de ser imediatamente remetido à Procuradoria-Geral da República. Não quando quem está no comando é Dallagnol; não quando seus comandados são o que revelam ser em mais essa série de conversas.

O "Menino Prodígio" da operação, o Robin dos justiceiros que confundem toga com a capa preta do Batman, tem um sonho, também revelado nesses diálogos: ele deixa claro que quer Dias Toffoli e Mendes fora do Supremo. Como já vimos, ao agora presidente do tribunal, tentou-se imputar relações impróprias com a OAS envolvendo a reforma de uma residência.

Não apenas a Suíça é mobilizada. Dallagnol também põe o aparato técnico da Lava Jato a serviço da caça a Gilmar. Determina um levantamento minucioso de seus votos para tentar demonstrar que, quando se trata de Lava Jato, ele usa critérios específicos para emitir juízos ou conceder habeas corpus. Nada disso, como sabemos, era inócuo: a imprensa costumava ser inundadas de boatarias e "levantamentos espontâneos" para tentar — sem contar os aparelhos de que a operação dispõe, disfarçados de imprensa, para atacar os alvos definidos por Curitiba.

Obviamente, Curitiba nada encontrou contra Gilmar na Suíça. Mas, como se vê, há uma espécie de obsessão. E de obsessão debochada. Especulando sobre a suposta existência de um cartão para Mendes, o procurador Roberson Pozzobon — aquele que queria criar empresa de palestras com Dallagnol em nome das respectivas mulheres — sonha: "Vai que tem um para Gilmar… hehehe" Ao que responde o procurador Athayde Ribeiro da Costa, fazendo pouco caso da Constituição e das leis: "Aí você estaria investigando ministro do Supremo, Robinho… Não pode". E manda a imagem de um macaquinho que cobre os olhos com a mão. Robinho, outro professor de educação moral e cívica da turma, responde: "Hahaha". E mais: "Não que estejamos procurando". E complementa: "Mais vaaai que".

Vale dizer: todos eles têm noção de que estão cometendo crimes.

Quem tem tal obsessão parece que pode fazer qualquer coisa, o que inclui plantar provas. Não há evidência de que tenha acontecido. Mas o que esperar de uma organização criminosa que está estruturada para depor dois ministros do Supremo que consideram empecilhos a seu projeto de poder?

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.