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Reinaldo Azevedo

Representante da PGR pede desculpa à 2ª Turma do STF por ações da Lava Jato

Reinaldo Azevedo

04/09/2019 08h12

"Queria deixar registrado, em nome da Procuradoria-Geral da República, um pedido formal de desculpas a todos que compõem este egrégio colegiado. Qual foi minha surpresa ao me deparar, horas depois do julgamento e nos dias seguintes, com manifestações de procuradores que compõem a força-tarefa em primeira instância expondo sua insatisfação com o julgamento. Foi publicada até mesmo uma nota pública pela Operação Lava Jato. Não cabe aos procuradores que oficiam perante os órgãos do Judiciário de primeiro grau fazer juízo de valor sobre os julgamentos deste Supremo Tribunal Federal — tarefa que, se fosse o caso, incumbiria exclusivamente ao titular deste ofício, que é a procuradora-geral da República".

A fala acima é do subprocurador-geral da República Antonio Carlos Bigonha, que representa a Procuradoria-Geral da República perante a Segunda Turma do Supremo. Ele se referia às reações destrambelhadas de procuradores que compõem à Lava Jato à decisão dos ministros que, por três votos a um, anularam a condenação de Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras, devolvendo o processo para a primeira instância. O tribunal entendeu, segundo o Inciso LV do Artigo 5º da Constituição, que garante o direito à ampla defesa e ao contraditório, que nos casos em que réus delatores acusam réus delatados, estes têm o direito de entregar por último as suas alegações finais, depois de conhecer os argumentos de quem os acusa. O único voto divergente foi o de Edson Fachin. Decidiram de acordo com a Constituição Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Por motivos de saúde, Celso de Mello não participou da votação.

A defesa do ex-gerente de Empreendimentos da Petrobras Márcio de Almeida Ferreira entrou com recurso semelhante na Segunda Turma, e Fachin, desta feita, preferiu remeter o caso para o pleno do tribunal.

Segundo a Procuradoria-Geral da República, Bigonha não se pronunciou em nome da instituição. Teria se expressado na condição de quem tem assento na Segunda Turma. Ele foi designado para a função por Raquel Dodge.

Bem, se não falou, deveria ter falado. A desordem que hoje ronda o sistema penal brasileiro deriva do desassombro com que procuradores de primeira instância, especialmente os integrantes da Lava Jato, passaram a desafiar todos os cânones não só do devido processo legal, mas também da hierarquia, do decoro e até do bom senso. Como deixa claro Bigonha, em caso de de inconformismo com a decisão do Supremo, cabe à Procuradoria-Geral da República se manifestar, fazendo-o dentro do devido processo legal. E foi o que fez Raquel Dodge.

Se manifestações dessa natureza tivessem vindo a público antes e se PGR, Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Superior do Ministério Público tivessem contido os abusos, não se teria chegado ao estágio do esculacho a que chegamos.

Cumpre lembrar, de resto, que a anulação de condenações não é sinônimo de absolvição. Caso prevaleça o entendimento da Segunda Turma, os casos que se encaixarem no tipo julgado pelos ministros voltam à primeira instância para que se cumpra o devido processo legal. A conversa de que isso servirá à impunidade, como propaga a Lava Jato, é coisa de quem pretende, se me permitem a expressão, legalizar a inconstitucionalidade.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.