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Reinaldo Azevedo

BTG é um dos alvos preferidos de Palocci, o da “delação do fim da picada”

Reinaldo Azevedo

03/10/2019 22h11

Palocci: autor da delação do fim da picada", já está claro, fala qualquer coisa. MPF ignorou, PF pegou (Reprodução)

O BTG Pactual foi alvo de mais um mandado de busca e apreensão, numa operação agora chamada "Estrela Cadente". O motivo: em sua delação premiada, Antonio Palocci acusa André Esteves, sócio principal do banco, de ter tido acesso, em agosto de 2011, a informação privilegiada sobre a queda, considerada então inesperada, da taxa Selic. A fonte teria sido Guido Mantega, que ocupava o Ministério da Fazenda.

Para lembrar: em julho daquele ano, a taxa foi elevada de 12,25% para 12,5%. Em agosto, no entanto, a instituição anunciou o corte para 12%, surpreendendo o mercado. Segundo o Ministério Público, a decisão do BC gerou ganhos extraordinários para o fundo "Bintang", que quer dizer "A Estrela", em indonésio. Em nota, o BTG diz tratar-se de fundo de um só cotista e que o banco era apenas seu administrador.

Segundo Palocci, parte dos ganhos obtidos por Esteves foi parar na campanha de Dilma e também acabaram beneficiando Lula. A esta altura, já dá para dizer, com certeza, que as acusações do ex-chefão petista parecem sempre convergir para o ex-presidente. Há 41 dias, o mesmo banco foi alvo de outro mandado de busca e apreensão, também motivado por denúncia de Palocci: nesse caso, ele acusa irregularidades na venda para a instituição financeira de ativos da Petrobras na África.

Em julho de 2018, Esteves e Lula foram absolvidos da acusação de obstrução da Justiça, acusados que haviam sido de tentar armar a fuga de Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras, para evitar a delação premiada. Ficou claro que tudo não passava de cascata de Delcídio do Amaral. O banqueiro, no entanto, ficou preso em Bangu entre o dia 25 de novembro e 19 de dezembro. No dia 5 de dezembro do ano passado, o Supremo arquivou investigação contra ele. As provas das acusações se esqueceram de comparecer ao processo.

Como se nota, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal não parecem dispostos a deixar tão cedo o que parece ser um filão, não é mesmo? Mais uma vez, o banco se torna alvo de uma operação. Pela segunda vez, quem está na raiz da ação é Antonio Palocci.

Será que vou eu aqui dizer que Esteves não fez nada, que a acusação é um delírio, que Palocci fala o que lhe der na telha e que topou qualquer parada para deixar a cadeia? Não! Eu não vou. Não estou investigando o caso. Não posso assegurar o que as pessoas fizeram ou deixaram de fazer. Mas posso, sim, lembrar o que andaram falando sobre o ex-ministro da Fazenda (governo Lula) e Planejamento (governo Dilma) os membros da força-tarefa de Curitiba.

A Lava Jato não deu bola para a delação de Palocci. E olhem que a rapaziada por lá é chegada, como já se sabe a essa altura, a um "pega e esfola". Os métodos influentes por aquelas paragens não poupam nem familiares de investigados. Palocci, no entanto, não conseguiu convencê-los. Diálogos entre procuradores no Telegram, no dia 3 de outubro de 2018, publicados em reportagem da Folha, em parceria com The Intercept Brasil, evidenciam o que os membros da força-tarefa pensavam a respeito. Vamos ver.

Jerusa Viecilli pergunta: "Dúvida: vamos fazer uso da delação do palocci? Isso foi discutido?". Januário Paludo responde: "O que Palocci trouxe parece que está no Google." Então fala Deltan Dallagnol: "Explica melhor, Je? Vc cogitaria não usar? Feito o acordo, creio que temos que tentar extrair o melhor dele e lutar para ele não receber benefícios diante da improbabilidade de que haja resultados úteis. Contudo, não me parece em uma primeira reflexão boa a estratégia de negar valor sem diligências".

A força-tarefa considerava imprestáveis as acusações de Palocci. Uma nota: o ganho tido como atípico do tal fundo Bintang, é bom lembrar, foi notícia à época. Dava para encontrar no Google. A propósito: Mantega passava informação privilegiada a Esteves e depois contava o feito a Palocci?

Em entrevista à Folha, Carlos Fernando dos Santos Lima, que já foi a segunda pessoa da Lava Jato, afirmou sobre Palocci:
"Vou dar o exemplo também do acordo do [Antônio] Palocci, celebrado pela PF depois que o Ministério Público recusou. Demoramos meses negociando. Não tinha provas suficientes. Não tinha bons caminhos investigativos. Fora isso, qual era a expectativa? De algo, como diz a mídia, do fim do mundo. Está mais para o acordo do fim da picada. Essas expectativas não vão se revelar verdadeiras. Eu acho que a PF fez esse acordo para provar que tinha poder de fazer."

Duvido que os procuradores da Lava Jato tivessem a intenção de preservar os alvos de Palocci, o que inclui Esteves, Lula, Dilma e qualquer coisa que se mova e que possa ajudá-lo a livrar a própria cara. Tudo indica, no entanto, que essa delação, que faz parte do braço de ferro entre MPF e PF, continuará a render mais notícia e prejuízos do que provas. Enquanto isso, seus alvos vão pagando o pato.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.