Ao tentar matar juíza, procurador prova que Moraes está certo no caso Janot
Um procurador da Fazenda Nacional tentou matar uma juíza, nesta quinta, no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo. Constato de saída: parece que o "Método Rodrigo Janot de Resolução de Conflitos" faz escola. Aliás, o homem que praticou o gesto tresloucado citou o nome do ex-procurador-geral da República como exemplo a ser seguido. Já volto ao caso. Antes, algumas considerações.
Li com certa estupefação as críticas à decisão do ministro Alexandre de Moraes, que determinou mandado de busca e apreensão em endereços de Janot. Seu porte de arma foi suspenso. Em livro e entrevistas, ele afirma ter entrado armado no Supremo, em maio de 2017, para matar o ministro Gilmar Mendes. Segundo as suas palavras, não sabe por que não o fez.
Moraes abriu a investigação, entre outros dispositivos legais, com base no Artigo 286 do Código Penal: incitamento ao crime. E aí começou a gritaria: "Oh, fantasiar com um crime não é crime". Bem, segundo as palavras do próprio ex-procurador-geral, ele não fantasiou apenas. Efetivamente tentou. Não obteve êxito por razões alheias à sua vontade. Também é um tipo penal. Trata-se do Inciso II do Artigo 14, a saber: "Crime tentado [ocorre] quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente".
No seu despacho, Moraes destacou:
"O quadro revelado é gravíssimo, pois as entrevistas concedidas sugerem que aqueles que não concordem com decisões proferidas pelos Ministros desta CORTE devem resolver essas pendências usando de violência, armas de fogo e, até, com a prática de delitos contra a vida".
Bingo! Nesta quinta, por pouco não corre sangue no TRF da 3ª Região. Leiam o que informou o site Consultor Jurídico. Volto depois.
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O procurador da Fazenda Nacional Matheus Carneiro Assunção foi preso nesta quinta-feira (3/10) depois de tentar matar uma juíza na sede do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, na avenida Paulista. Ele invadiu o gabinete da juíza Louise Filgueiras, convocada para substituir o desembargador Paulo Fontes, em férias, e chegou a acertar uma facada no pescoço dela, mas o ferimento foi leve.
Antes de se descontrolar totalmente, o procurador despachara com a desembargadora Cecilia Marcondes, quando já se mostrou alterado. Assunção então foi ao gabinete do desembargador Fábio Prieto, no 22º andar. Ele presidia uma sessão de julgamento e não estava no gabinete no momento.
O procurador, então, desceu as escadas e invadiu a sala que fica imediatamente abaixo, de Paulo Fontes, mas ocupado por Filgueiras durante suas férias.
A juíza trabalhava em sua mesa e foi surpreendida pela invasão do procurador, mas conseguiu se afastar dele —as mesas dos desembargadores são bastante amplas, o que dificultou o acesso de Assunção à vítima.
Diante do insucesso, ele ainda tentou jogar uma jarra de vidro na direção da magistrada, mas errou. O barulho da jarra quebrando foi o que chamou a atenção dos assessores. E o procurador foi imobilizado pelas pessoas que estavam dentro do gabinete durante a ação.
Assunção foi preso em flagrante e no momento aguarda a chegada da Polícia Federal para ser levado da sede do tribunal, na região central de São Paulo. Ele ainda não tem advogado constituído.
Quem viu o procurador se movimentar pelo tribunal comentou que ele parecia em estado de surto e intercalava frases sem sentido com de efeito sobre "acabar com a corrupção no Brasil". Ao ser imobilizado, o procurador se mostrou confuso. Segundo os seguranças que o detiveram, Assunção afirmou que deveria ter entrado armado no tribunal, "para fazer o que Janot deixou de fazer".
Neste momento, enquanto a Polícia Federal chega no prédio do tribunal para dar voz de prisão ao agressor, a segurança do TRF está mapeando a sua andança pelo prédio.
REPERCUSSÃO
"Não bastasse a notícia recentemente divulgada de que um Procurador da República pensou em atentar contra a vida de um ministro do STF, agora temos uma infeliz ocorrência no TRF de São Paulo. Para além de lamentar o ocorrido e se solidarizar com a vítima e todos os colegas do tribunal, urge mais uma vez repensar os níveis de segurança das cortes e dos fóruns, em todo o país", lamentou Jayme de Oliveira, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB).
Para Fernando Mendes, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), não pode se admitir qualquer ataque à magistratura. "A magistratura vem sendo atacada simbolicamente nos últimos tempos, e essa campanha nefasta na tentativa de desacreditar a instituição acaba estimulando o comportamento criminoso de indivíduos. Temos de dar um basta a isso."
Segundo Marcos da Costa, ex-presidente da OAB-SP, "não podemos admitir que se estabeleça um clima de ódio dentro do ambiente que deveria ser marcado pelo respeito entre aqueles que estão a dedicar suas vidas em prol da justiça".
RETOMO
Eis aí.
O site "Jota" informa que, no dia em que afirmou ter tentado matar Gilmar Mendes, o então procurador-geral nem estava em Brasília…
Pois é… Ainda que Janot tivesse fantasiado sobre o assassinato, essas coisas podem ter consequências quando se publica um livro com o relato, concedem-se várias entrevistas e se secreta, ainda agora, ódio visceral pelo mesmo alvo.
Notem que Matheus Carneiro Assunção evocou o herói Janot ao praticar seu ato tresloucado.
E aí? Alguém mais vai sair por aí a defender que um ex-procurador-geral pode dizer impunemente que entrou armado no Supremo para matar um ministro?
Artigo 286 do Código Penal: incitamento ao crime.
Ainda que Janot tenha fantasiado a tentativa de assassinato, as palavras que disse são reais e se propagam no mundo igualmente real. E, nesse mundo, as pessoas seguem tanto os bons como os maus exemplos.
Ao provocar quase uma tragédia, Matheus Carneiro Assunção evidenciou o erro dos nefelibatas do vale-tudo.