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Reinaldo Azevedo

Inquérito pedido por Moro e aceito por Aras é uma soma de aberrações

Reinaldo Azevedo

31/10/2019 07h46

Bolsonaro e Moro: ministro da Justiça aproveita episódio para demonstrar sua fidelidade ao líder. Por enquanto ao menos ( Foto: Pedro Ladeira/07.05.2019/Folhapress)

O pedido de Sérgio Moro para que o Ministério Público Federal abra um inquérito contra o porteiro para investigar denunciação caluniosa, obstrução da justiça e falso testemunho é uma aberração. E outra aberração é Augusto Aras aceitar a incumbência, como se fosse um bedel da diretoria…

É um espanto. Por enquanto ao menos, o porteiro é testemunha. O que estão fazendo é mobilizar a máquina federal para intimidar uma testemunha que prestou depoimento ao Ministério Público Estadual, num caso cujo foro é a Justiça do Rio.

Mais: se constatado mesmo o falso testemunho, o dolo, o caso é de competência estadual.

Sergio Moro resolveu mostrar serviço. E, pelo visto, Aras também.

O site Conjur ouviu juristas a respeito. Seguem algumas opiniões:
Lenio Streck
"A prerrogativa de foro é do autor do suposto fato delituoso. Nunca para a vítima. Não tem nenhum sentido nesse pedido de Moro ao MPF. Além de tudo o pretenso crime de denunciação caluniosa é de competência estadual. Tudo errado, pois. Simples assim. Parece até que estamos de volta a pancompetência de Moro na "lava jato". Qualquer coisa, arrastava para Curitiba. Processo penal não admite isso".

Fernando Hideo Lacerda
"Não é atribuição do ministro da Justiça requisitar instauração de inquérito com base em notícia de jornal. Não se deve confundir a relevante função no Ministério da Justiça com a representação de interesses pessoais do presidente da República. Sergio Moro deveria voltar suas preocupações à defesa da ordem constitucional e proteção dos direitos fundamentais, ao invés de oficiar ao procurador-Geral da República, requisitando apuração de notícia de jornal sobre "crimes de assassinato", expressão essa que sequer existe em direito penal e revela desconhecimento técnico sobre a matéria".

Davi Tangerino
"Denunciação caluniosa é fazer nascer um procedimento jurídico a partir de notícia de fato de que se sabe falso. Pelo que li, o porteiro, ouvido como testemunha, narrou os fatos conforme sua lembrança. Ele nem deu causa, dolosamente, a uma investigação, tampouco temos elementos para dizer que o fez falsamente. Esse delito não se aplica aos fatos. Outra questão relevante é: exatamente o que pretende o Ministério da Justiça que se investigue? Se for eventual delito do porteiro, teríamos no máximo um falso testemunho, de competência estadual".

Fernando Castelo Branco
"A autoridade policial já competente e que já está investigando este caso, pode muito bem investigar a obstrução de Justiça, o falso testemunho e a denunciação caluniosa. Essa medida me parece ser uma burla e um desvio de finalidade por ter um caráter de intimidar as pessoas que eventualmente serão ouvidas. Como se mandando um aviso para essas pessoas não envolverem o presidente"

Wellington Arruda
"Temos a impressão que no presente caso a atitude do ministro Moro teve muito mais viés autoritário do que técnico jurídico, isso porque o processo está sob responsabilidade da Polícia Civil do Rio de Janeiro, que tem tomado uma série de cautelas para garantir a lisura da investigação. Pressionar o órgão de investigação e, em especial, o porteiro, desta forma, nos parece desmedido e desnecessário, já que a investigação não apresentou nenhuma conclusão e, inclusive, a própria investigação poderá, em tese, entender que houve equívoco por parte do porteiro ou mesmo falso testemunho e nestes casos, por exemplo, o nome do presidente seria desconsiderado e consecutivamente não haveria, sequer, necessidade de manifestação do próprio STF."

Alberto Zacharias Toron
"A questão mais tormentosa é a de se saber se se torna possível a uma outra autoridade policial, de outro ramo da Justiça, apurar um falso testemunho de um crime cuja autoria ainda  está sob apuração, de forma concomitante e paralela. Isso deve merecer maior atenção".

 

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.