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Reinaldo Azevedo

“No tocante” a Flávio, placar do Supremo já é de 6 a zero pró-investigação

Reinaldo Azevedo

28/11/2019 05h11

Flávio passou a ser investigado após o COAF identificar movimentação financeira considerada atípica em sua conta corrente e na de seu ex-assessor Fabrício Queiroz (Foto: Dida Sampaio/Estadão)

A decisão do Supremo sobre Recurso Extraordinário que trata do compartilhamento de dados da Receita Federal e da Unidade de Inteligência Financeira com órgãos de investigação, como Polícia e Ministério Público, deve sair nesta quinta, ainda que o julgamento não seja concluído.

Até agora, só o ministro Dias Toffoli, relator, posicionou-se a favor da imposição de algumas restrições a esse compartilhamento. Os demais ministros seguiram a divergência aberta por Alexandre de Moraes e se opuseram às restrições: Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber. O placar, portanto, está em 5 a 1. Se ao menos mais um magistrado aderir à tese de Moraes, como deve acontecer, a fatura está liquidada. Ainda não votaram Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello.

Já chamei aqui a atenção para o fato e volto a fazê-lo: Toffoli votou pelo provimento do recurso extraordinário interposto pelo MPF contra decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), que anulou ação penal em razão do compartilhamento de dados obtidos pela Receita Federal com o MP sem autorização judicial.

Entenderam o ponto? No que diz respeito ao Recurso Extraordinário, o julgamento já está em seis a zero. Em nenhum momento, o presidente do STF sugeriu que o compartilhamento sem autorização judicial fosse considerado inconstitucional.

Para lembrar: Toffoli concedeu uma liminar suspendendo os inquéritos oriundos desses compartilhamentos, em recurso apresentado pela defesa de Flávio Bolsonaro, até que o Supremo tomasse uma decisão a respeito. É importante frisar que, ainda que seu voto prevalecesse, a investigação sobre o senador seria retomada. Em seu voto, o ministro defendeu, no entanto, que sejam observadas algumas restrições, a saber:
Sobre a UIF
– São lícitas as comunicações dirigidas pelas autoridades competentes à UIF, as quais não consistem em requisição, possuindo a UIF plena autonomia e independência para analisá-las, produzir, eventualmente, o RIF (Relatório de Inteligência Financeira_) e disseminá-lo para as autoridades competentes;
– não é possível a geração de RIF por encomenda (fishing expeditions) contra cidadãos sem alerta já emitido de ofício pela unidade de inteligência ou sem qualquer procedimento investigativo formal estabelecido pelas autoridades competentes;
– os RIFs caracterizam-se como meios de obtenção de prova, não constituindo provas criminais;
– o recebimento das comunicações, a produção e a disseminação dos RIF são realizados única e exclusivamente mediante sistemas eletrônicos de segurança com certificados e registro de acesso.

Sobre a Receita Federal
– É vedada a transferência da íntegra de documentos acobertados pelos sigilos fiscal e bancário – como a declaração de Imposto de Renda e os extratos bancários – sem a prévia autorização judicial (Constituição Federal, artigo 5º, incisos X e XII);
– O Ministério Público Federal, ao receber a representação fiscal para fins penais e instaurar procedimento investigativo criminal (PIC), deve comunicar o juízo competente, tendo em vista o compartilhamento de informações protegidas por sigilo fiscal.

Cumpre destacar que acho corretas as restrições de Toffoli. Creio que é o que está adequado à Constituição. Mas o voto do ministro será derrotado. Dou como certo que Cármen Lúcia, por exemplo, tende a votar com Moraes. Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio já expressaram contrariedade com o fato de  presidente do STF ter tratado em sua liminar e em seu voto também dos dados da UIF, já que, originalmente, o Recurso Extraordinário dizia respeito apenas à Receita.

Moraes não endossou as restrições de Toffoli, observando, no caso da UIF, que, se o MP pedir dados complementares, precisa abrir um Procedimento Investigativo Criminal (PIC) ou solicitar a abertura de inquérito. Em qualquer caso, observou, é preciso garantir o sigilo de dados.

REDAÇÃO DO ACÓRDÃO
A redação do acórdão deve ficar a cargo de Moraes, que tende a ser o voto vitorioso. Como o caso tem repercussão geral reconhecida, caberá ao ministro propor eventual disciplinamento de procedimentos. Hoje em dia, os diálogos da Vaza- Jato já o demonstram, há quebra ilegal de sigilo até de… ministros do Supremo. Fica tudo como está?

De toda sorte, insista-se: a investigação sobre Flávio Bolsonaro certamente será retomada. E seria ainda que a posição de Toffoli saísse vitoriosa. Lembre-se de novo: seu voto foi pelo provimento do recurso interposto pelo MPF, que pedia que fosse tornada sem efeito decisão do TRF-3 que anulara ação penal que teve origem em compartilhamento de dados.

Vale dizer: não era isso que estava em votação.

Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.