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Maia, que indicou Zveiter, vai a almoço secreto com chefão da Globo um dia antes de relatório

Reinaldo Azevedo

11/07/2017 07h31

Ora quem diria, não?

A TV Globo, que virou gerente da agenda do presidente Michel Temer, que não é obrigado a divulgá-la, promove encontros à socapa com aquele que o conglomerado já elegeu futuro presidente da República. Vocês entenderam direito.

Segundo reportagem publicada pela Folha, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que só se reelegeu presidente da Câmara porque contou com o apoio de Temer — e, como resta escandalosamente claro, na contramão da Constituição e do Regimento Interno —, presidente da Câmara manteve um encontro no domingo com Paulo Tonet, vice-presidente de Relações Institucionais do… Grupo Globo!!!

Em carro descaracterizado e sem ser perseguido por repórteres e cinegrafistas da TV Globo — afinal, como sabem, essa conversa de interesse jornalístico tem limites —, Maia foi almoçar na casa de quem manda. Estava acompanhado, entre outros, dos deputados Benito Gama (PTB-BA) e Heráclito Fortes (PSB-PI) e do ministro Fernando Bezerra Coelho (Minas e Energia), também do PSB.

Atenção! Pouco antes, Maia havia se reunido com o próprio presidente no Palácio do Jaburu.

Eram etapas do golpe sendo cumpridas. A coisa já vinha de antes. Sim, foi um Rodrigo que indicou o deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) relator da denúncia na CCJ, mas não foi o Pacheco, presidente da Comissão, e sim o Maia, presidente da Câmara. Posto de outro modo: o grupo Globo, que ofereceu o almoço a Maia, decidira que um de seus advogados seria o autor do relatório.

Agora dá para entender por que reportagens do Jornal Nacional, isentas como um táxi, fazem anteceder ao nome Michel Temer a expressão "presidente denunciado". Alguns jovens buliçosos da GloboNews e outros nem tão jovens, mais ainda assim buliçosos, chamam a atenção, como é mesmo?, para os encontros secretos que o presidente manteria fora da agenda, como o jantar havido na casa de Gilmar Mendes, ministro do Supremo e presidente do TSE, por exemplo.

Entenderam? Um presidente da República estaria a fazer algo de ilegítimo e sorrateiro — e foi esse o tom dispensado ao encontro — quando vai à residência do presidente de um tribunal, mas aquele que um grupo econômico quer entronizar nem que seja na marra não faz nada de especioso quando vai bater um rango na casa do vice-presidente de Assuntos Institucionais do potentado.

Convenham: no Regime Militar, as organizações Globo se encarregavam de popularizar o ditador de plantão. Mas não depunham os presidentes nem escolhiam seus sucessores.

Cada era tem o Heráclito que merece. O Fortes, o nosso, é do Piauí, não de Éfeso, para quem o mundo consistia numa luta, sem conciliação, de forças contrárias. Não! O de agora busca a síntese. Já pertenceu à Arena, ao PMDB, ao PFL e hoje está no PSB. Ninguém, a não ser o próprio, diria ser ele um socialista.

Pois bem: Heráclito tentou descaracterizar a conspirata afirmando que o almoço estava "marcado havia mais de um mês". E acrescentou, em conversa com a reportagem da Folha: "Era para ser lá em casa, mas Tonet resolveu fazer na casa dele. As pessoas estão vendo coisa onde não existe. Maia tem sido muito correto".

Claro que sim! O nosso Heráclito, à diferença do seu xará grego do século V a.C., é mesmo dado a uma dialética. Vislumbra uma síntese entre o golpe a legalidade.

À noite, Maia chamou para a sua casa parlamentares da base aliada para uma sopa com pizza. Afirmou ao grupo que havia dito ao próprio Temer que achava difícil que resista à segunda denúncia. Foi além: disse ter almoçado com "gente muito importante" que fazia a mesma avaliação.

Então ficamos assim: Maia começa seu dia num papo com Temer e, segundo disse, anteviu ao interlocutor uma derrota na Câmara. Em seguida, vai almoçar com um alto executivo do grupo que prega abertamente a deposição do presidente — é a tal "gente muito importante". Na sequência, reúne parlamentares em sua casa para dar um jeito de fazer cumprir a própria profecia.

Trata-se, obviamente, de um golpe de Estado, que tem como protagonistas um grupo econômico, o Ministério Público Federal e o presidente da Câmara, que sonha agora em tomar o mandato de Temer e se candidatar depois à reeleição. Ficou com um teco do mandato de Eduardo Cunha à frente da Câmara e se reelegeu depois, na contramão da Constituição. Agora quer um teco do mandato de Temer e certamente sonha em ser depois ungindo pelo povo.

A essa miséria foi reduzida a política no país.

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Sobre o autor

Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.

Sobre o blog

O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.


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