Moro barbariza a língua com a ligeireza com que agride o estado de direito
Reinaldo Azevedo
05/07/2019 23h55
Vamos ser claros? Gramática não é categoria moral. É possível pregar as maiores atrocidades respeitando-se todos os relevos da língua de Camões. E o erro pode esconder, ou até revelar, poesia pura.
O ex-juiz e agora ministro tem, no entanto, a fama de um homem preparado. Em direito, tal condição supõe leitura, dedicação, estudo, cultivo intelectual etc.
E, bem, Moro evidencia ser um bárbaro da língua e da lei.
Eu já havia apontado há muito tempo sua gramática torta. Porque, desde logo, cultivei o hábito masoquista de ler o que ele escreve — incluindo a sentença que condenou Lula. Mas Moro se encarregou de nacionalizar o trato que dispensa à Inculta & Bela quando largou aqueles "conges"…
No mesmo dia, mandou bala num "haviam" e lascou um "podem vim". No programa do Bial, empregou "rugas" em lugar de "rusgas". Na sua mais recente passagem pela Câmara, disse que a Lava Jato está "sobre ataque", em vez de "sob". No Senado, deixou escapar um "menas", mas se corrigiu a tempo.
Agora, na mensagem trocada com Dallagnol em que se refere a Faustão, diz que o apresentador está na televisão "a 28 anos", assim mesmo, sem o "h" que indica que a palavra é verbo e designa tempo decorrido.
Não só. Na hora do subjuntivo, massacrou de novo a língua. Diz a Dallagnol: "Agradeço se me manter informado" — em vez de "mantiver".
Descuido?
Não!
É falta de preparo mesmo.
Moro é uma espécie de cavalo de parada que se fingiu de cavalo de corrida.
Tem porte, mas não tem fôlego jurídico.
O trato com a língua é apenas um dos canais por onde vaza o despreparo, já conhecido e reconhecido por muitos de seus pares.
Faria mal à língua fosse a dita-cuja sua matéria de trabalho. Também ela padece. Mas o agora ministro é eficaz mesmo é na agressão ao estado de direito.
Sobre o autor
Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM.
Sobre o blog
O "Blog do Reinaldo Azevedo" trata principalmente de política; envereda, quando necessário — e frequentemente é necessário —, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.